O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu ontem, por unanimidade, acatar uma liminar favorável aos geradores de energia eólica e solar em ações judiciais relacionadas ao curtailment — os cortes deliberados de geração renovável. A decisão terá efeitos apenas para o futuro, sem retroatividade ao período da primeira liminar concedida aos geradores, em dezembro de 2023 e posteriormente cassada antes de ser aplicada.
O acórdão com mais detalhes da decisão deve ser publicado nos próximos dias, e a MegaWhat apurou que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que é polo passivo na decisão, já se prepara para recorrer no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Enquanto a liminar estiver vigente, contudo, os geradores terão direto ao ressarcimento da energia não gerada por determinação do Operador Nacional do Sistema Elétrico (STF).
O que é o curtailment?
O curtailment ocorre quando o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) determina que fontes renováveis não despacháveis, como solar e eólica, interrompam a geração por razões como restrições de consumo, problemas na transmissão ou requisitos de confiabilidade técnica do sistema.
Essas interrupções têm gerado custos significativos para os geradores, especialmente em casos de cortes por razões energéticas, que não são reembolsados, ou quando ultrapassam as franquias estabelecidas para cortes por problemas de transmissão.
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Desde o ano passado, a judicialização sobre o tema se intensificou, liderada pela Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) e pela Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), que questionam as regras aprovadas pela Aneel para os ressarcimentos dos cortes.
O aumento expressivo no volume de cortes, em parte relacionado ao apagão de agosto de 2023 e aos atrasos na entrada de reforços de transmissão no Nordeste, agravou a situação. Empreendimentos localizados em estados como Ceará e Rio Grande do Norte sofreram impactos severos, com cortes superiores a 50% em alguns casos.
Com a decisão de ontem, os geradores comemoraram a possibilidade de mitigação de custos futuros, mas o cenário segue em debate. Ajustes realizados pelo ONS, como mudanças nos critérios de cortes e a resolução de atrasos em obras de transmissão, trouxeram algum alívio, mas a questão estrutural do curtailment permanece.
O crescimento acelerado da geração renovável e a expansão da geração distribuída têm aumentado os desafios para a operação do sistema elétrico, reduzindo a margem de manobra do operador.
A judicialização do curtailment
Até o fim de outubro, havia 12 ações judiciais questionando os efeitos dos cortes e defendendo o ressarcimento integral, sendo 11 delas movidas individualmente por geradores afetados pelo problema, além da ação principal que representa as associações dos geradores.
Em dezembro de 2023, um juiz convocado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) aceitou o argumento das associações e determinou que a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) fizesse os pagamentos das compensações aos geradores na liquidação do mercado livre seguinte.
O pedido tinha sido formulado em agosto, logo depois do apagão daquele mês, mas a liminar foi negada em primeira instância.
A decisão liminar não chegou a ser cumprida. Inicialmente, a CCEE alegou que a Aneel precisava definir as regras do pagamento para que fosse aplicado. Em julho, antes disso acontecer, a Aneel conseguiu derrubar a decisão, ao alegar que não havia urgência para justificar uma liminar.