Produção de nova turbina

Vestas quer dar ‘choque de estímulos’ para sustentar cadeia eólica brasileira

Vestas investe R$ 150 milhões em linha de produção de nova turbina e costurou acordos com Santander e governo do Ceará para oferecer antecipação de recebíveis e transferência de créditos tributários a novos projetos eólicos no estado

Eólica Vestas/ Crédito: Peter Dazgatz (pixabay)
Eólica Vestas - Crédito: Peter Dazgatz (pixabay)

A fabricante de turbinas eólicas Vestas anunciou nesta sexta-feira, 9 de agosto, um pacote de iniciativas para estimular a cadeia eólica brasileira. A estratégia da dinamarquesa envolve investimentos de R$ 150 milhões para fabricar um novo modelo de turbina no país, além de parceria com o Santander de até R$ 2,5 bilhões para antecipação de recebíveis de fornecedores e acordo com o governo do Ceará para transferência de créditos tributários a novos projetos eólicos instalados no estado.

O anúncio vem em um momento desafiador para a indústria, com ausência de novos projetos em função do baixo preço da energia. “É muito importante que a gente crie estímulos para que a cadeia fique viva”, disse o presidente da Vestas, Eduardo Ricotta.

A falta de novos projetos já levou a GE Vernova a interromper a fabricação de componentes no Brasil. A Siemens Gamesa hibernou sua fábrica na Bahia, além dos problemas de qualidade enfrentados em projetos no exterior.

“O setor tem passado por uma desindustrialização precoce e acelerada”, reconhece o vice-presidente de Assuntos Regulatórios e Governamentais da Vestas América Latina, Leonardo Euler. Segundo ele, o Brasil foi competitivo em criar uma cadeia eólica mas, sem medidas para “reativar a demanda industrial”, o setor pode ser desmobilizado. “Não faz sentido que o Brasil, que é um país que tem uma dotação natural tão privilegiada, vire importador de turbinas”, complementa.

Demanda estável e novas rotas para sustentar indústria

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Para a diretoria da Vestas, o setor precisa de demanda estável em um horizonte de “três a cinco anos”. Sem aumento relevante na carga, a empresa acredita que este aumento na demanda pode vir por meio da abertura do mercado livre, onde o consumidor pode escolher a fonte de energia, e por meio de leilões de energia de reserva (LER).

Mudanças regulatórias também seriam bem-vindas. Para o diretor de Procurement da Vestas na América Latina, Rodrigo Ugarte, o “crescimento desenfreado” da geração distribuída (GD) solar prejudica todo o setor de geração e pode trazer a “curva do pato” observada nos Estados Unidos ao Brasil.

Nada disso, entretanto, tem data para acontecer no Brasil. Neste cenário, a Vestas avalia que a melhoria da competitividade da indústria pode fomentar novos projetos eólicos, e aposta em seu pacote de estímulos para isso.

Novas tecnologias, como hidrogênio e amônia verdes, também são vistas como rotas possíveis para incentivar a indústria. Para Eduardo Ricotta, o Nordeste é um “hub perfeito para fazer exportação”, já que a região tem grande geração eólica e é também a mais próxima de grandes mercados consumidores, como Europa e Estados Unidos.

Mesmo assim, uma revisão nos encargos para exportação pode ser importante, diz Rodrigo Ugarte. “Se isso não acontecer, dificilmente a gente vai se tornar um exportador em larga escala”, acredita.

O chamado “custo-Brasil” também leva a Vestas a ver a exportação de equipamentos com mais ceticismo. Para Ugarte, os encargos tornam o Brasil menos vantajoso do que países como China e Índia, mesmo tendo tecnologia e estando mais próximo a mercados como América Latina.

R$ 150 milhões para fabricar novo modelo de turbina no Brasil

Como parte de seu “pacote de incentivos”, a Vestas investirá R$ 150 milhões para instalação de linha de produção da turbina V163-4,5 MW em sua fábrica de montagem de hubs e naceles localizada em Aquiraz, no Ceará. O investimento foi antecipado na última semana pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e é definido pela Vestas como uma “transferência de tecnologia”.

Segundo a Vestas, a V163-4,5 MW traz otimizações em relação ao modelo V150, que já é fabricado no Ceará e, de acordo com Leonardo Euler, “foi a turbina que melhor se adaptou aos ventos brasileiros”.

O novo modelo tem tamanho de rotor maior e área de varredura das pás 18% maior, resultando em um fator de capacidade mais alto. Ambos os modelos serão produzidos no Brasil, o que deve permitir novas combinações aos projetos, na avaliação da empresa.

Para o presidente Eduardo Ricotta, o novo produto reduz o custo de energia e aumenta a competitividade para novos projetos, incentivando que eles saiam do papel.

Transferência de créditos tributários para projetos no Ceará

A Vestas também fechou acordo com o governo do estado do Ceará para transferência de créditos tributários acumulados pela empresa entre 2019 e 2021. A companhia poderá passar estes créditos a novos projetos eólicos implantados no Ceará que utilizem turbinas e pás produzidas no estado, que também conta com uma fábrica de pás da Aeris no porto de Pecém.

Com isso, a Vestas e o governo do Ceará esperam dar um novo estímulo a projetos no estado. Leonardo Euler comenta que o Ceará teve “muito protagonismo” no começo da indústria eólica brasileira, mas nos últimos anos outras regiões do Nordeste, como Bahia, Rio Grande do Norte e Piauí, vêm tomando a dianteira em novos projetos.

Parceria de até R$ 2,5 bilhões com Santander

Enquanto a nova turbina e incentivos ficais podem incentivar a demanda, o pacote da Vestas pretende apoiar a cadeia de suprimentos pelo lado financeiro. A companhia costurou acordo com o Santander para implementar um programa de antecipação de recebíveis a seus fornecedores, com vantagens progressivas de acordo com a performance ESG das empresas.

Segundo a Vestas, este é o primeiro programa do Santander associado à sustentabilidade para o setor de energia no Brasil. Eduardo Ricotta conta que o programa terá inicialmente R$ 1 bilhão em orçamento, podendo chegar a R$ 2,5 bilhões.

“Quanto mais ESG forem as empresas, mais barata é a redução do desconto”, diz. Segundo ele, o custo de capital que hoje é por volta de 1,8% ao mês, poderá chegar a 0,85% ao mês no programa com o Santander.

Assim, além de apoiar os fornecedores, a Vestas cria formas de reduzir sua pegada de carbono nos escopos 1 e 2, associados ao consumo próprio e à cadeia de suprimentos.

*A jornalista viajou a convite da Vestas