Um recurso da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) contra a regulamentação dos critérios para apuração e pagamento de restrição de operação por constrained-off foi rejeitado hoje pela maioria dos diretores da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), mas a discussão que durou quase duas horas, envolveu o formalismo da agência e alternativas para acelerar a revisão dessas regras, atualmente questionadas por geradores na Justiça.
O diretor Fernando Mosna, relator do processo, propôs a abertura de uma consulta pública por 30 dias, a fim de discutir a classificação dos eventos de corte de geração renovável, a transparência do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) sobre a classificação dos eventos, e a franquia de horas para o pagamento dos geradores.
O voto teve apoio apenas do diretor Ricardo Tili, mas foi rejeitado pelos demais três diretores da Aneel, que defenderam, durante a discussão, que os “ritos da agência sejam seguidos sem atropelos”, uma vez que é preciso analisar com profundidade todas as consequências antes de uma mudança.
“A estabilidade regulatória não é correr para mudar e tentar compreender todas as mudanças. A estabilidade regulatória está muito no rito da regulação, do debate público”, disse a diretora Agnes da Costa durante a discussão. Segundo ela, seguir o rito de discussão, com a realização de analise de resultado regulatório (ARR) e análise de impacto regulatório (AIR) antes de propor normas novas não é “formalismo excessivo” e sim garantir robustez nas normas.
O argumento de Mosna, vencido na diretoria, era que como a regulamentação do tema já dura quatro anos, uma vez que o conceito da regra vem de 2021, os problemas enfrentados pelas empresas hoje com relação ao curtailment faz com que o momento seja oportuno para uma reavaliação das normas de ressarcimento aos geradores eólicos e solares. Para ele, o maior risco, no momento, é demorar em tomar alguma medida.
O que é o curtailment?
Os cortes de geração renovável foram regulamentados pela Resolução Normativa 1.030, de 2022, alterada posteriormente pela Resolução Normativa 1.073, em 2023, que determinou a classificação das restrições de geração solar fotovoltaica em três categorias: indisponibilidade externa, atendimento a requisitos de confiabilidade elétrica, e energética. Apenas no caso de indisponibilidade externa, caso de problemas em linhas de transmissão, por exemplo, existe ressarcimento da energia não gerada, desde que ultrapassem as franquias horárias definidas em norma.
A resolução foi aprovada em setembro de 2023, mesmo mês que a Absolar entrou com o recurso. Antes disso, em 15 de agosto, um apagão em quase todo o país levou o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) a implementar restrições nos intercâmbios de energia, aumentando a incidência dos cortes de geração conhecidos pelo termo curtailment.
O tema foi judicializado em 2023 e, no fim de 2024, os geradores conseguiram uma limitar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para obter o ressarcimento integral da energia não gerada. Em janeiro de 2025, contudo, a Aneel reverteu a decisão no Superior Tribunal de Justiça (STF).
No seu voto, o diretor-relator contou que recebeu a Absolar e a Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica) nas últimas semanas para discutir o assunto, quando ouviu relatos das consequências graves enfrentadas pelos geradores como consequência da redução da energia gerada.
Mosna entendeu que o pleito da associação questionava, na prática, a eficácia das regras publicadas em 2021 sobre os cortes de geração eólica, já que o entendimento de quem pode ou não ser ressarcido foi mantido depois na regulamentação dos cortes de geração solar. Isso justificaria, no seu entender, a abertura de uma consulta pública para revisitar as regras.
Possíveis aprimoramentos
Para Mosna, quando a regra limitou os casos de ressarcimento dos cortes de geração aos eventos por restrição externa, limitados por franquias horárias, houve “indesejado esvaziamento da previsão legal e executiva” da lei que trata do assunto, a Lei 10.848, de 2004, e “extrapolou a atividade regulatória” da Aneel que seria de normatizar os eventos.
“Destaco que em vários sistemas (Califórnia e Texas, por exemplo) a implementação de soluções de armazenamento (baterias) pelos geradores tem sido avaliada como alternativa para lidar com o curtailment. Ocorre que, diferentemente desses mercados, em que a sinalização de preço é mais eficaz, entendo que no atual estágio de desenvolvimento do mercado brasileiro, é salutar que o regulador estude alternativas para incentivar sua adoção pelos agentes”, disse o diretor em seu voto.
Como as restrições por indisponibilidade externa têm característica de imprevisibilidade, o diretor-relator opinou que não é cabível impor uma franquia mínima de ressarcimento dos eventos.
Em relação aos cortes por confiabilidade elétrica ou razão energética, tidos na regra atual como risco do negócio, o diretor opinou que mesmo se os geradores se prepararem, não existe solução à prova de falha. Por isso, poderia ser adotada franquia máxima a ser concedida aos geradores, o contrário da franquia mínima da norma para indisponibilidade externa.