Com quase 35 GW em capacidade instalada, a geração distribuída (GD) já representa a segunda maior fonte de geração de energia no país, ainda que não seja considerada geração, e sim abatimento da carga. Para a Echoenergia, braço de geração renovável do grupo Equatorial, é urgente uma mudança nas regras que viabilize a aplicação do curtailment também sobre a GD, a fim de reduzir os impactos na geração centralizada e os subsídios implícitos pagos pela tarifa.
“Naquele horário de pico da geração solar, quase não há carga, porque a GD consome essa carga. Se não há carga, é preciso cortar a geração centralizada, que é o que o ONS consegue cortar para equilibrar o sistema, e isso impacta as eólicas e solares [centralizadas], que são as últimas cortadas na priorização”, disse Liu Aquino, CEO da Echoenergia.
Para o executivo, a GD, especialmente em sua modalidade remota — pequenos parques que abastecem diversos consumidores e contam com sistemas de medição semelhantes aos das usinas de maior porte —, poderia ser integrada a uma gestão mais flexível pelas distribuidoras de energia por meio de tecnologia. “É uma questão de interesse”, disse. Soluções de medição online poderiam ser implementadas pelas distribuidoras, permitindo o corte seletivo dessa energia quando necessário, contribuindo para a eficiência do sistema elétrico.
A distribuidora seria “o agente ideal” para fazer essa gestão, já que são essas empresas que podem avaliar o impacto da GD sobre a rede de baixa tensão. “Ela teria que ser empoderada para todas essa decisão”, disse.
Impactos no setor e subsídios
A proposta reflete uma preocupação crescente com o impacto da GD no sistema elétrico brasileiro. A GD, por sua natureza, não é considerada na operação centralizada conduzida pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), e a energia gerada por esses sistemas é abatida diretamente do consumo. Segundo Aquino, essa desconexão criará um cenário complexo e insustentável nos próximos anos, quando a GD, ainda em franco crescimento, deve representar uma parcela ainda maior do consumo total, deixando ao ONS apenas fontes inflexíveis para gerenciar.
Os cortes de GD teriam ainda efeito positivo na conta de luz, de acordo com o presidente da Echoenergia. Segundo Aquino, em uma conta simplificada, os sistemas de geração distribuída elevam a conta de luz em cerca de 10% devido ao subsídio implícito pago pelos consumidores que não possuem esses sistemas, pois esses acabam arcando com uma maior parcela dos custos da rede. Na visão do executivo, aplicar cortes de 10% na GD poderia reduzir em 1% a conta de luz desses consumidores.
“Em uma ponta, a gente tá cortando energia barata, que são as fontes eólicas e solares centralizadas, porque é mais fácil e dá pra cortar. E do outro a gente protege uma energia subsidiada, que é a GD”, disse.
Para a Echoenergia, é fundamental repensar os subsídios atuais. Embora reconheça que sua própria geração renovável tenha se beneficiado de incentivos no passado, Aquino defende que, no longo prazo, esses subsídios são insustentáveis.
Segundo dados do Subsidiômetro da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), até esta quinta-feira, 19 de dezembro, os subsídios do setor já chegaram a R$ 38,5 bilhões em 2024, sendo que R$ 11,2 bilhões foram para as chamadas fontes incentivadas, geração renovável centralizada que tem direito ao desconto pelo uso da rede – caso de muitos empreendimentos da Echoenergia – e R$ 10,5 bilhões em subsídios para a GD.
“Como uma empresa, obviamente, buscamos maximizar o resultado com base nos incentivos que o sistema gera pra gente. Mas, no longo prazo, estamos aqui para defender o sistema elétrico, para que no longo prazo continue sendo um sistema isonômico”, disse o executivo.
Solução para novos projetos
A ideia da Echoenergia é que a mudança nas regras da incidência dos cortes aconteça apenas nos projetos futuros, tanto em GD quanto em geração centralizada. Para os projetos existentes, a estratégia da empresa ainda é buscar um ressarcimento integral dos cortes, assunto discutido atualmente na via judicial. Uma liminar obtida recentemente por geradores renováveis determinou o ressarcimento dos cortes futuros, mas o mérito da ação defende o ressarcimento integral dos custos passados também.
“Quando foram tomadas as decisões de construção das usinas que estão no sistema hoje, não existia sinal específico para corte de energia. O que é preciso é uma mudança urgente de regra para que as novas usinas, ao entrarem no sistema, terem o sinal correto”, disse Aquino, completando que esta também é sua visão para a geração distribuída.