Nos primeiros dias da 27ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 27), mais de 100 líderes mundiais estiveram reunidos em Sharm El-Sheikh, no Egito, para discutir a implementação e o aprofundamento dos acordos climáticos globais.
O grande desafio, no entanto, deve ser tirar do papel as discussões para redução das emissões de gases do efeito estufa e da temperatura a 1,5°C até 2050, como aponta Adriano Correia, sócio da PwC Brasil.
“Não só promessas, mas decisões de como viabilizar a transição e a descarbonização. O que fazer, todo mundo sabe, já está dado. Agora, como fazer isso, e rapidamente, é o complexo”, disse o sócio da consultoria e auditoria.
E a tarefa se torna ainda maior num momento em que o mundo busca alternativas para o gás natural e o petróleo importados da Rússia, sem impactar na segurança energética dos países, principalmente na Europa.
Em seu discurso na COP 27, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, reforçou os compromissos europeus com relação ao Acordo de Paris (2015) e pediu maior financiamento dos países do Norte àqueles considerados emergentes ou em desenvolvimento.
“Nós pedimos aos nossos parceiros do Norte Global que aumentem seu financiamento climático para o Sul Global. A Europa já está entregando a sua parte dos US$ 100 bilhões prometidos. Pelo segundo ano consecutivo, nós ultrapassamos o valor de 23 bilhões de euros – apesar da pandemia de covid-19 e da guerra russa”, disse von der Leyen, entendendo que “a Europa está na direção correta”.
A Alemanha vem realizando investimentos em infraestrutura para a importação de gás natural e gás natural liquefeito (GNL) de novos fornecedores, assim como de hidrogênio e novas tecnologias que acelerem a transição energética e a descarbonização do país. Por outro lado, também reativou térmicas a carvão para segurança energética.
Em seu discurso na conferência, o chanceler alemão Olaf Scholz afirmou que “não pode haver um renascimento global dos combustíveis fósseis”, pedindo aos participantes que não abandonem seus objetivos relativos às energias renováveis, apesar dos impactos da invasão russa à Ucrânia.
Segundo Scholz, o país deve aumentar seus investimentos em programas internacionais com foco no meio ambiente para 6 bilhões de euros, dobrando para 2 bilhões de euros os fundos para proteção florestal até 2025.
Apesar de os países europeus terem voltado a considerar os combustíveis fósseis para segurança energética, a exemplo da Alemanha, o sócio da PwC aponta que a crise pode até significar, momentaneamente, um passo atrás nas metas de mitigação das mudanças climáticas, mas que deverá resultar na aceleração da transição energética nos países europeus.
“Você não vai reduzir a utilização de petróleo a zero, isso é utópico. Mas as empresas de petróleo terão um papel importante na transição energética, até em relação a financiamentos que devem vir dessas grandes empresas de óleo e gás”, disse Adriano Correia.
No primeiro dia de discussão da COP27, o presidente francês Emmanuel Macron reiterou sua posição no que diz respeito ao conflito no leste europeu, afirmando que o país não sacrificará seus compromissos climáticos pela ameaça energética da Rússia. Segundo Macron, é preciso acelerar a descarbonização das economias e mitigar os efeitos do aquecimento global.
O primeiro-ministro britânico Rishi Sunak também salientou durante a conferência que a invasão da Rússia à Ucrânia e a alta nos preços não devem justificar a desaceleração das ações relacionadas ao clima, mas sim servir como motivo para dar celeridade à transição energética.
“Diversificar nosso suprimento energético com investimentos em renováveis é precisamente a maneira de termos garantias contra a dependência energética”, afirmou Sunak. “O Reino Unido está entregando o seu compromisso de 11,6 bilhões de libras e, como parte disso, nós vamos triplicar nossos fundos em adaptação [às mudanças climáticas] para 1,5 bilhões de libras até 2025”.
Com discursos sempre em defesa do meio ambiente, o presidente colombiano Gustavo Petro estreou na COP 27 realçando o que considera como o fracasso das conferências e instituições globais no que tange os assuntos climáticos – aqui, pode-se fazer um paralelo com o desafio mencionado por Correia. Petro afirmou que o mercado não é o mecanismo para superar a crise climática e, pelo contrário, foi a própria acumulação de capital que a produziu.
Segundo o chefe de Estado colombiano, “a COP já não dá mais respostas e o tempo se esgotou. As conferências globais e os governos devem pôr a política a serviço da realização de um plano global de desconexão dos hidrocarbonetos imediatamente. A descarbonização é uma mudança real e profunda do sistema econômico dominante”.
Além disso, Petro também fez um apelo a países como o Brasil, Peru, Venezuela e Estados Unidos para a proteção da Amazônia, anunciando a destinação de US$ 140 milhões anuais durante os próximos 20 anos para este fim. “A crise climática só pode ser superada se deixarmos de consumir hidrocarbonetos”, reiterou.
Para Mauro Toledo, diretor de Strategy, a expectativa é que a COP 27 continue avançando em relação à conferência do ano anterior, assim como vem ocorrendo a cada edição, mas sem grandes surpresas.
“Não acredito numa ‘bala de prata’ em termos de decisões, mas algo que vai se maturando um pouco de edição em edição”, apontou Toledo.