O Tribunal de Contas da União (TCU) notificou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre o que considera serem indícios de ilegalidade na resolução normativa 930/2021, publicada na edição desta terça-feira, 13 de abril, do Diário Oficial da União, e que garante às hidrelétricas que repactuaram o GSF em 2015 a adesão retroativa à nova repactuação que está em fase de regulamentação.
A Aneel terá cinco dias para se pronunciar sobre a representação, período no qual deverá se abster de colocar em prática os efeitos da resolução. Com isso, a diretoria da agência retirou da pauta da reunião de hoje os pedidos de reconsideração apresentados pelas controladoras das hidrelétricas de Belo Monte, Jirau e Santo Antonio que tratavam do tema.
A notificação foi assinada pelo ministro do TCU Benjamin Zymler. Ele acatou uma representação da SeinfraElétrica que apontou os indícios de ilegalidade na resolução, responsável por elevar as estimativas de ganhos das hidrelétricas com a repactuação do GSF de R$ 15,7 bilhões para R$ 19,9 bilhões, segundo cálculos da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Em 2015, as usinas participantes do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) repactuaram o GSF nos termos da Lei 13.203/2015. A opção envolvia a contratação de uma espécie de “seguro” pelas usinas garantindo o repasse do risco hidrológico aos consumidores, em contrapartida, a depender do produto contratado. A solução não foi considerada atrativa pelas usinas contratadas no mercado livre, e só teve adesão de usinas com contratos no mercado regulado.
Fez-se necessária a discussão a respeito de uma nova repactuação do GSF, desta vez voltada para o mercado livre, que se concretizou na Lei 14.052/2020. A lei excluiu do GSF aqueles fatores que não eram efetivamente risco hidrológico, como deslocamento hídrico causado pela geração de termelétricas fora da ordem de mérito, os efeitos da motorização das usinas estruturantes, e também atrasos em linhas de transmissão.
Esses valores foram convertidos em extensão das concessões das usinas e trazidos a valor presente. Para aderir à repactuação e receber a extensão de outorga, que será contabilizada como ativo em seus balanços, os agentes devem abrir mão das liminares que protegem da exposição ao risco hidrológico nas liquidações do mercado de curto prazo de energia.
Essas condições foram regulamentadas por meio da resolução normativa 895/2020, e, na sequência, alguns agentes apresentaram pedidos de reconsideração à Aneel. Em 30 de março, o diretor da Aneel Efrain Cruz submeteu o processo à apreciação dos demais diretores, e parte dos recursos foi aprovada com três votos contra dois, permitindo ampliar os efeitos da nova repactuação.
A resolução 930/2021 estabeleceu que as hidrelétricas que já repactuaram o GSF em 2015 poderão aderir à nova repactuação, referente ao período anterior a 2015. Como a Lei 14.052 trata do período de 2012 a 2020, esses agentes poderão ser beneficiados pelo período de 2012 a 2015 com as novas condições propostas.
Essa decisão é que levou a CCEE a revisar os cálculos apresentados em março, ampliando o ganho correspondente às novas outorgas para as usinas hidrelétricas em R$ 4,2 bilhões, para R$ 19,9 bilhões.
Segundo o TCU, contudo, há indícios de ilegalidade na decisão da Aneel, já que a Lei 14.052 determina que não fazem jus a compensação retroativa aqueles agentes que já repactuaram o risco hidrológico em 2015.
Durante a reunião desta terça-feira da diretoria da Aneel, o relator do voto vista do processo, Sandoval Feitosa, retirou o processo da pauta, citando a notificação do TCU, que foi entregue à agência reguladora na tarde de ontem, 12 de abril. Ele justificou a decisão afirmando ser necessário ter a “segurança do encaminhamento da matéria em todas as suas perspectivas.”
O diretor Efrain Cruz defendeu sua posição e o cumprimento dos ritos adequados. “Durante a instrução do processo, conversei com diversas vezes com as áreas técnicas”, afirmou, se referindo às críticas do TCU que as regras não haviam sido seguidas de forma adequada pela diretoria. Em relação ao fato de que a decisão da Aneel com a resolução 930 ter contrariado o parecer da procuradoria da agência, Cruz lembrou que os pareceres não são vinculantes.
“Vamos conversar com o tribunal de contas, ele nos dá a oportunidade de fazer uma reflexão, em que pese suspender os processos até uma decisão final do TCU”, disse Cruz.