Os novos modelos de negócios e as mudanças comportamentais devem influenciar a trajetória da demanda de energia nos próximos anos, com destaque para os recursos energéticos distribuídos, que devem impor desafios para o sistema elétrico brasileiro. A análise é do primeiro caderno do Plano Nacional de Energia (PNE) 2055, lançado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) nesta segunda-feira, 6 de janeiro.
Os cenários surgem como tendência para o horizonte, que deve ser marcado por uma mudança na geopolítica de energia, devido ao crescimento de novos atores na cadeia produtiva, e pela emergência climática, tida como uma das pressões para redução das emissões de gases de efeitos estufa de diferentes segmentos da economia global, assim como o alcance do Net Zero em 2050.
Segundo o estudo, a transformação na direção de economias de baixo carbono vai envolver movimentos de descentralização e digitalização, com o protagonismo do consumidor e a maior descentralização dos sistemas energéticos permeando este cenário.
Segundo o PNE, o protagonismo do consumo acarretará aumento dos Recursos Energéticos Distribuídos (REDs), que trazem desafios, ao mesmo tempo que ajudam na redução de perdas e no aumento da confiabilidade do sistema.
O crescimento da modalidade deve levar à necessidade de aprimoramentos metodológicos, de modelagem e de políticas de compartilhamento de informações que possam garantir a identificação adequada dos requisitos de expansão, possibilitando um planejamento energético e uma operação futura segura.
Disputa na cadeia produtiva
O posicionamento da China e de outros países no desenvolvimento tecnológico e em diversas cadeias relevantes da transição energética (como equipamentos para transmissão, painéis fotovoltaicos, baterias, etc.) pode gerar desafios relacionados à dependência produtiva e tecnológica do sistema energético brasileiro e à competitividade nacional.
Segundo o estudo, preocupações sobre segurança energética e oportunidades para desenvolvimento de cadeias produtivas (novas e existentes) devem surgir em meio a transição energética do país.
Por outro lado, o Brasil pode se destacar na produção de minério de ferro, cobre, ouro, alumínio, nióbio e urânio – alguns destes materiais são usados na produção de equipamentos relevantes para as fontes renováveis.
“A disputa tecnológica e a corrida por minerais críticos, indispensáveis para expandir as energias renováveis, assim como os impactos da guerra na Ucrânia, mostram como a geopolítica e a busca por sistemas energéticos mais resilientes têm ganhado protagonismo”, destaca o PNE.
PNE: Crescimento de geração variável e o aumento de investimentos
As fontes intermitentes também surgem como tendências para o alcance do Net Zero até 2050, conforme estudo, levando ao aumento nos investimentos de tecnologias que tragam flexibilidade e controlabilidade, de modo a fazer frente às alternâncias da geração e da carga.
Além do sistema de transmissão, o estudo aponta a necessidade de desenvolvimento/implantação de tecnologias de armazenamento de energia, Sistemas de Transmissão de Corrente Alternada Flexíveis (FACTs), compensação reativa variável, mecanismos de resposta de demanda, tecnologias meteorológicas, entre outros.
Com a expansão das variáveis e demanda por novas tecnologias, a mobilização de instrumentos financeiros e regulatórios deve ser ainda maior. Nestes quesitos, a EPE diz que o Brasil tem adotado diversos instrumentos financeiros e regulatórios para financiar a transição energética e promover o desenvolvimento sustentável, o que inclui os fundos climáticos, títulos verdes, precificação de carbono e a taxonomia sustentável brasileira.
Políticas públicas, como o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), o Programa Luz para Todos e a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) também são citadas.
Porém, investimentos públicos e publicamente orientados de pesquisa, desenvolvimento e demonstração (PD&D) em energia devem ser necessários para redução de custos e criação de novas tecnologias.
“É necessário acelerar e dar escala aos investimentos em inovação, tanto em eficiência energética e energias renováveis, mas também em novas tecnologias associadas aos setores de difícil descarbonização, além de tecnologias habilitadoras, como ligadas à transformação digital”, pontua o estudo.
Segundo a plataforma Inova-e, os investimentos públicos em PD&D em energia chegaram a totalizar R$ 2,0 bilhões em 2014, e após sucessivas quedas totalizou R$ 683 milhões em 2022, movimento que começa a ser revertido a partir de 2023.
Já os investimentos públicos e publicamente orientados de pesquisa, desenvolvimento e demonstração em energia no período de 2013 a 2023 foram superiores a R$ 4,0 bilhões por ano, sendo que 74% deste montante é de investimentos publicamente orientados, ou seja, regulados por agências reguladoras.