Regulação

Após errar conta, governo tem 15 dias para achar solução e manter tarifa de Itaipu

Problema veio de erro em cálculo feito após acordo entre Brasil e Paraguai, em maio de 2024

Fernando Mosna, diretor da Aneel, durante 3ª reunião pública da diretoria de 2025
Segundo diretor Fernando Mosna, relator do processo na Aneel, governo não procurou agência para falar sobre assunto desde que problema foi apontado, em dezembro | Foto: Michel Jesus/Aneel

A ENBPar, estatal que administra a Eletronuclear e a participação brasileira em Itaipu, pode precisar fazer um aporte de cerca de R$ 700 milhões na tarifa para evitar um reajuste tarifário e manter o compromisso firmado com o Paraguai no ano passado, depois que um erro de cálculo levou a um descasamento entre a tarifa repassada ao consumidor e a receita prevista para 2025.

A diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) discutiu a questão durante a reunião desta terça-feira, 4 de fevereiro, e deu um ultimato, na forma de um prazo de 15 dias, para que a ENBPar e o Ministério de Minas e Energia (MME) apresentem uma solução concreta para evitar um aumento expressivo na conta de luz.

Sem um aporte, a tarifa do consumidor pode ter um acréscimo de US$ 120,9 milhões (equivalentes a cerca de R$ 700 milhões, no câmbio atual), o que representaria impacto de 5,99% sobre a tarifa de repasse, que é dolarizada. O montante já considera o saldo negativo estimado para a Conta de Comercialização de Itaipu de 2024, de R$ 333 milhões, mais o aumento do custo de cessão calculado para 2025.

Outra possibilidade seria o governo alterar o Decreto 11.027/2022, que definiu as regras da comercialização da energia de Itaipu Binacional.

Erro na hora de calibrar’ tarifa

O problema foi sinalizado pela Aneel em dezembro de 2024, na hora de calcular a tarifa de repasse de Itaipu para 2025. Na ocasião, o diretor Fernando Mosna, relator do processo na Aneel, explicou que houve um erro na hora de “calibrar” o aporte que a usina binacional deveria fazer para manter a tarifa inalterada entre 2024 e 2026, apesar de um acordo com o Paraguai para subir a tarifa.

O acordo entre Brasil e Paraguai, firmado em maio, manteve o Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade (Cuse) de Itaipu em US$ 19,28/KW.mês em 2024, 2025 e 2026. Foi feito um arranjo, porém, para manter do consumidor brasileiro a cobrança de US$ 16,71/kW.mês, valor que já tinha sido aprovado, provisoriamente, no fim de 2023, mais uma cobrança de US$ 0,95/kW.mês referente ao custo da energia cedida ao Brasil, chegando à tarifa de US$ 17,66.

Para garantir a tarifa mais baixa, Itaipu se comprometeu a aportar US$ 300 milhões por ano para subsidiar o Cuse ao consumidor brasileiro. Na prática, a ENBPar paga para a Conta de Comercialização de Energia Elétrica de Itaipu o valor de US$ 19,28, mas a binacional devolve para a sua controladora a diferença equivalente a US$ 2,57, e o aumento não chega a ser cobrado das distribuidoras de energia.

Segundo Mosna, o provisionamento foi calculado com base no Cuse estimado, mas a tarifa de repasse é uma somatória do Cuse com outras componentes, valores que não ficaram cobertos.

Isso foi constatado pelas áreas técnicas da Aneel, que estimam que a Conta de Comercialização de Itaipu deve fechar 2024 com saldo negativo de R$ 332,6 milhões – o número definitivo será conhecido em abril. Conforme a análise, considerando o déficit e o custo necessário para cobertura dos custos envolvidos, a tarifa deste ano deveria ser de R$ 18,72/kW.mês, acima do que foi estabelecido no compromisso entre Brasil e Paraguai.

Sem resposta do governo

Diante da impossibilidade de cumprir todas as regras, a Aneel decidiu prorrogar a tarifa vigente, sem aumento, até 31 de março, e deu 45 dias ao governo para uma explicação, prazo que termina amanhã, 5 de fevereiro.

Desde então, a Aneel enviou ofícios ao MME e à ENBPar solicitando retorno, e em 27 de janeiro a estatal pediu a prorrogação do prazo por 45 dias para apresentar uma resposta, argumentando a complexidade do tema para isso.

“Durante os 45 dias originalmente concedidos para manifestação do MME e da ENBPar, não houve qualquer solicitação formal de reunião, tentativa de diálogo com este relator ou seu gabinete, nem comunicação sobre eventuais avanços na formulação de uma alternativa concreta para o equacionamento da questão”, disse Mosna na leitura do voto, com exceção de um contato recebido ontem, 3 de fevereiro, do diretor de Comercialização da ENBPar, Wander Azevedo, que pediu uma reunião presencial. O encontro que aconteceu ontem mesmo, na Aneel.

Ele refutou a justificativa do pedido de adiamento, já que seria preciso apontar de forma objetiva os aspectos técnicos que demandam análise adicional, e disse que a Aneel não aguarda “meramente informações ou sugestões do MME e da ENBPar, mas sim a comunicação formal de uma solução concreta”.

Duas possibilidades na tarifa

Para o diretor, há duas possibilidades: aumentar o custo repassado ao consumidor, ou definir e implementar uma estratégia para evitar o repasse dos custos, por meio de aporte complementar de Itaipu Binacional na Conta de Comercialização de Itaipu ou alteração do Decreto 11.027/2022, das regras da comercialização de energia da usina.

O prazo de 15 dias foi concedido de forma “excepcional” pela diretoria da Aneel, dada a relevância do tema e a necessidade de uma decisão célere, embora os diretores tenham avaliado que a agência já deu prazo suficiente antes para uma resposta do governo e da estatal.

“Caso, ao final desse novo prazo, nenhuma solução concreta seja apresentada pelo MME e pela ENBPar, a questão será imediatamente submetida à deliberação da diretoria da Aneel, com a inclusão do valor na tarifa de repasse, nos termos da regulamentação vigente”, disse o voto aprovado por unanimidade da diretoria.