A próxima reunião pública da diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deve discutir a proposta de abertura de consulta pública para colher subsídios e informações adicionais para o aprimoramento da proposta de orçamento anual da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) de 2025. Segundo Camila Bomfim, superintendente de Gestão Tarifária e Regulação Econômica da autarquia, a indicação é de aumento na CDE, sendo necessária uma discussão sobre a forma de rateio e a possibilidade da transferência de alguns custos para o orçamento da União.
“Não tem racionalidade na forma de rateio da CDE, que é uma política pública. Política pública tem que ser paga levando em consideração a capacidade de pagamento dos consumidores. As tarifas estão ficando mais caras nas regiões que têm menor IDH e precisamos reverter essa situação. Isso envolve a regra de rateio da CDE, que foi alterada em 2016”, falou Bomfim em audiência pública realizada na Câmara dos Deputados para falar sobre os motivos do aumento da conta de luz nesta quinta-feira, 5 de dezembro.
Representando a agência na sessão, a superintendente disse que o assunto será tratado na próxima reunião da autarquia, marcada para 10 de dezembro, e há “indicação de que vai haver aumento do encargo da CDE, com repercussão na tarifa”. Na avaliação de Bomfim, uma das questões do rateio são as diferenças entre as 102 concessionárias e permissionárias de distribuição, que tem características próprias e, por isso, tarifas distintas.
“As diferenças entre as tarifas têm se ampliado. É o que a gente chama da boca do jacaré, que está cada vez abrindo mais. Temos redes mais novas e um volume grande de investimentos para a expansão delas no Norte e no Nordeste, regiões onde a parcela da distribuição tem um peso maior. Mas, essas regiões têm uma densidade de carga e consumo per capita menor [em relação as outras]”, pontuou.
Para ela, o crescimento da carga tributária e dos encargos setoriais na tarifa, dito por Bomfim como “principal vilão” do crescimento da conta, devem impactar cerca de 80 milhões de unidades consumidoras atendidas na baixa tensão, que não têm acesso ao mercado livre e não têm poder aquisitivo para investir em painéis solares em suas residências.
“A tarifa de energia tem ficado em linha com o IPCA [Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo]. Este ano, em média, o reajuste das tarifas foi em torno de 0,6% contra o IPCA de 4,7%”, falou.
Bomfim apontou outras distorções dentro da CDE como os subsídios para as fontes incentivadas e para a geração distribuída e defendeu “uma grande reforma setorial” para lidar com o cenário, considerando o custo e benefício de cada fonte e a racionalização da CDE. Em sua avaliação, tais discussões precisam envolver a segurança regulatória do setor e o fortalecimento, autonomia e a independência financeira e decisória da Aneel.
“É preciso uma racionalização da CDE, impor limite e/ou transferir para o orçamento geral da União alguns subsídios, mudar a forma de rateio, que precisar ser mais justa e observar a capacidade de pagamento. Também é preciso uma revisão da tarifa social, que está há mais de duas décadas desta forma e não está atendendo mais as necessidades energéticas desses consumidores”, disse após destacar a necessidade da redução das perdas não técnica e aumento de medidas de eficiência energética.
Falta de limites na CDE
Presente na audiência, Leandro Cunha, auditor federal de Controle Externo e assessor da Unidade de Auditoria Especializada em Energia Elétrica e Nuclear (AudElétrica) do Tribunal de Contas da União (TCU), chamou atenção para a ausência de limitação de gastos na CDE e para o pedido da corte de elaboração de um plano de ação contendo atividades e cronograma de estudos técnicos para fundamentar uma revisão dos subsídios do setor elétrico brasileiro pelo Ministério de Minas e Energia.
“Dentro da nossa auditoria [responsável pelo pedido à pasta] aparece uma nova onda de possíveis proposições de mais subsídios. Tivemos uma onda no passado e estamos em uma nova, que favorece subsídios, porque nós queremos que as empresas instalem novas tecnologias. Por isso, pedimos ao MME a revisão e aprimoramentos regulatórios da Aneel”, afirmou Cunha.
O auditor também abordou os custos de Angra 3 e disse que é preciso discutir a fixação de um preço para a retomada ou não da obra.
Reforma do setor
Representantes de associações do setor também estiveram na sessão e abordaram a necessidade de limites nos subsídios, principalmente para as fontes eólica e solar, a abertura e o equilíbrio entre os mercados, soluções para sobrecontratação e curtailment, a revisão da contratação compulsória de térmicas prevista no projeto de lei da eólica offshore e a reforma do segmento.
Para Bernardo Sicsú, vice-presidente de estratégia e comunicação da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel), o Congresso precisa rever emendas do projeto de lei da offshore, que “encarecem a conta de luz” e retomar as discussões do Projeto de Lei (PL) 414, que trata da modernização do setor.
Marisete Pereira, presidente da Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica (Abrage), ponderou, entre outras questões, a necessidade de o Sistema Interligado Nacional (SIN) precisar de potência adicional, dada a chance do déficit chegar a 5,5 GW, e sugeriu uma rediscussão do PL 414, considerando as mudanças na matriz brasileira e os seus desafios atuais.
“Dadas as mudanças que tivemos, seja no setor de produção, seja no setor de consumo, é impossível consertar qualquer coisa se não for feita uma revisão ampla, geral e restrita do nosso arcabouço setorial. Isso deve ser feito por iniciativa do Poder Executivo, com ampla participação do setor”, disse Luiz Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia.