Opinião da Comunidade

Ana Carolina Calil e Karin Hatanaka escrevem: Decreto dá início à era das eólicas offshore no Brasil

Ana Carolina Calil e Karin Hatanaka escrevem: Decreto dá início à era das eólicas offshore no Brasil

Por:  Ana Carolina Katlauskas Calil e Karin Yamauti Hatanaka*

Foi publicado em 25 de janeiro o decreto nº 10.946/2022, que dá o primeiro passo para viabilização de plantas de geração de energia eólica offshore. A geração eólica no mar já é realidade em diversos países e apresenta, quando comparada com sua contraparte onshore, algumas vantagens: aerogeradores maiores e mais potentes e menor intermitência, ventos mais constantes e estáveis e menor interferência à população, já que se encontram distantes das áreas povoadas.

Apresenta, também, seus próprios desafios. Além das complexidades técnicas de içamento das torres no mar e do escoamento da energia até a costa, há o desafio jurídico referente à propriedade da área em que será implantado o projeto. Enquanto em empreendimentos onshore, o terreno do projeto é normalmente uma propriedade privada, no caso de projetos offshore, o local de implantação é o mar, de propriedade da União. A garantia do uso das áreas nas quais as plantas serão desenvolvidas e operadas é uma peça importante para implantação de projetos dessa natureza.

O decreto possibilita a cessão de uso de espaços físicos e aproveitamento de recursos naturais em águas interiores ou no mar para fins de geração de energia elétrica por meio de dois instrumentos: a cessão planejada e a cessão independente.

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A cessão planejada corresponde à oferta de áreas verticais delimitadas pelo Ministério de Minas e Energia (MME), os “prismas”, mediante processo de licitação.

Por sua vez, a cessão independente corresponde à cessão de prismas requeridos por iniciativa de terceiros interessados. A cessão de uso independente poderá ser indeferida em caso de sobreposição com prisma cedido ou em processo de cessão ou se houver indício de uso especulativo da área. A intenção é que as áreas sejam cedidas para efetiva implantação dos projetos, sem “reservas” de grandes áreas com finalidade de comercialização posterior.

A cessão de uso será onerosa, ou seja, remunerada à União. No caso da cessão planejada, por licitação, a cessão de uso será outorgada à proposta que gerar maior retorno à União.

Anteriormente à cessão de uso, seja planejada ou independente, a instalação do parque eólico será analisada por diversas autoridades, como Ibama, Comando da Marinha, Aeronáutica, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Ministério do Turismo, entre outras, que avaliarão se o projeto causa interferência no meio ambiente, navegação, aeródromos, atividade de pesca ou impacto paisagístico, entre outros. Como resultado dessa avaliação, as autoridades emitirão uma Declaração de Interferência Prévia (DIP).

A celebração da cessão de uso não substitui a necessidade de obtenção de autorização a ser emitida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para o exercício da atividade de geração, nos termos da legislação vigente.

Quanto à comercialização da energia, o Decreto indica que o MME poderá realizar leilões específicos para a contratação de energia proveniente de fonte eólica offshore, conforme indicado pelo planejamento setorial.

O decreto, que entra em vigor em 15 de junho de 2022, e algumas de suas disposições ainda devem ser objeto de detalhamento, como a forma de condução dos processos licitatórios para a outorga das cessões de uso.

Ainda, espera-se que seja encontrada uma solução de simplificação para autorização e licenciamento dos projetos, haja a vista a grande quantidade de autoridades governamentais envolvidas.

Uma questão importante para os projetos offshore, por fim, é a solução para a transmissão da energia, que ainda é um calcanhar de Aquiles do nosso sistema energético. Vale recordar que algumas regiões do país – especialmente a região Nordeste – ainda são afetadas por eventos de constrained-off que inviabilizam a injeção de energias renováveis no sistema.

Espera-se que parte desses questionamentos sejam equacionados com a publicação de regulamentação do MME, prevista para ser emitida em até 180 dias da entrada em vigor do Decreto.

O decreto n° 10.946/2022 é bem-vindo e dá um passo importante para o desenvolvimento de projetos eólicos offshore no Brasil que, em conjunto com outras discussões setoriais – como a possibilidade de contratos de compra e venda de energia em moeda estrangeira e estruturas de autoprodução –, prometem manter o mercado de energia elétrica brasileiro aquecido para além de 2022.

Ana Carolina Katlauskas Calil e Karin Yamauti Hatanaka, são sócias na área de Infraestrutura Energia de TozziniFreire Advogados

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