O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Enel da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) pede o indiciamento de três executivos da companhia, bem como a intervenção e o encerramento do seu contrato de concessão. O documento foi publicado na quarta-feira, 13 de dezembro.
Composto por 204 páginas, o documento enumera supostas situações de “negligência e ineficiência” na prestação dos serviços da Enel de 2018 a 2023, especialmente no episódio do “apagão” decorrente das fortes chuvas registradas na Região Metropolitana de São Paulo em 3 de novembro. Para os parlamentares da comissão, a companhia teria descumprido o seu contrato no período.
>> Distribuidoras terão que aperfeiçoar detecção de eventos severos, redução de danos e comunicação.
Intervenção
O primeiro pedido da comissão parlamentar é a “intervenção imediata” do contrato da companhia para garantir a continuidade, eficiência e a segurança no fornecimento de energia elétrica da área de concessão da Enel SP e que engloba 24 municípios da região metropolitana do estado.
Auditoria
Também é determinada uma auditoria, pelos órgãos competentes, para analisar o período compreendido pela gestão da empresa, a fim de “apurar eventuais irregularidades e infrações que culminaram com os expressivos índices de insatisfação dos usuários”. Caso as suspeitas sobre a “negligência” da distribuidora sejam verificadas, os parlamentares pedem ainda a caducidade do contrato concedido à Enel.
Caducidade de concessão
A caducidade é a previsão da rescisão contratual, que consiste no encerramento do contrato pela ocorrência de situações irregulares elencadas pelo Legislador, conforme informações do relatório final da CPI. A caducidade da concessão pode ser declarada pelo poder concedente quando o serviço é prestado de forma inadequada ou deficiente, tendo por base as normas, critérios, indicadores e parâmetros definidores da qualidade do serviço; quando a concessionária descumprir cláusulas contratuais ou disposições legais ou regulamentares concernentes à concessão; e em situações de paralisação do serviço, ressalvadas as hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força maior.
Também pode resultar em caducidade situações em que a concessionária perder as condições econômicas, técnicas ou operacionais para manter a adequada prestação do serviço concedido; não cumprir as penalidades impostas por infrações, nos devidos prazos; e não atender a intimação do poder concedente no sentido de regularizar a prestação do serviço.
Indiciamento
A CPI da Alesp pede ainda o indiciamento no Ministério Público Estadual e Federal por “presumível cometimento de crimes contra o consumidor” de Max Xavier Lins, presidente da Enel São Paulo; Nicola Cotugno, ex-presidente da Enel Brasil e Vicenzo Ruotolo, diretor de Operações de Rede da Enel Brasil.
Além disso, foram recomendadas diversas medidas para novos contratos de concessão, incluindo a redução do prazo de revisão tarifária, previsão para melhorias nas ações de fiscalização do sistema de subestações de energia, aprimoramento do serviço de atendimento ao consumidor e revisão dos critérios de apuração de eventos climáticos extremos.
Os problemas
Durante a apresentação do relatório final, o deputado Luiz Cláudio Marcolino (PT) pontuou que a Enel não investe adequadamente na modernização de sua rede elétrica e que possui uma imagem negativa diante da opinião pública, mesmo com os trabalhos da CPI apontando que a concessionária cumpriu suas obrigações contratuais.
Marcolino ainda destacou que os problemas do serviço de distribuição de energia elétrica se originaram na privatização da empresa.
“É inquestionável que o setor privado não tem qualquer compromisso com obrigações públicas e o bem-estar da sociedade. O seu objetivo central é o lucro. Quando o setor foi privatizado, houve aumento de lucro e piora da qualidade dos serviços”, justificou ele.
O parlamentar defendeu também que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deveria encerrar o contrato de concessão da Enel São Paulo antes de 2028, quando ele termina oficialmente, e elaborar estudos técnicos para que a energia volte a ser distribuída pelo poder público.
Além disso, os parlamentares afirmam que empresa é “campeã” no número de reclamações feitas pelos consumidores no Procon São Paulo e em sites de reclamação.
Ao longo dos seis anos de concessão, a Enel acumulou R$ 109 milhões de multas no Procon-SP e R$ 150 milhões na s.
“A situação chegou a tal ponto, que a penalidade de multa não se mostra mais eficaz para garantia da eficiência e manutenção dos serviços de contínuo e seguro”, diz trecho do documento.
Também foi destacado no relatório final uma suposta falta de cuidados na preservação da rede elétrica.
Transparência
Por sua vez, o deputado Luiz Fernando Teixeira (PT) disse que a Aneel deve determinar que a Enel tenha um portal de transparência para se comunicar diretamente com as 24 prefeituras onde opera seus serviços de podas de árvore e distribuição de energia elétrica.
“A Enel deverá estabelecer mais transparência, sob os critérios previstos em lei, para o acesso à informação para quem tem a cobrança da energia elétrica com base na tarifa social, para que esse benefício seja assegurado, por meio de lei federal, com maior divulgação e clareza às famílias de maior vulnerabilidade social”, disse Teixeira.
Posicionamento
Em nota, a Enel afirma que vem cumprindo todos os indicadores de qualidade previstos no contrato de concessão e que os investimentos na rede elétrica da sua concessão reduziram em 46% as interrupções de energia.
“Desde que adquiriu a [AES] Eletropaulo em 2018, a companhia tem realizado uma média anual de investimentos da ordem de R$ 1,35 bilhão por ano, contra cerca de R$ 800 milhões por ano investidos pelo controlador anterior. Em 2022, foram aportados R$ 1,96 bilhão, volume recorde de investimento destinado, principalmente, à digitalização e automação da rede elétrica, à expansão da capacidade do sistema de distribuição e à execução de obras estruturais como construção de novas subestações e modernização das subestações existentes.
“Esses investimentos nos últimos anos levaram a uma melhoria dos indicadores de duração e frequência das interrupções de energia medidos pela Aneel”, afirma a concessionária.
No Ceará
Outra CPI envolvendo a Enel foi prorrogada por 120 dias. Na comissão, a Assembleia Legislativa do Ceará investiga supostas irregularidades e abusos por parte da Enel em sua área de concessão no estado.