Política energética

Reforma do setor elétrico pode reacender disputa sobre subsídios à GD

painel solar em telhado
Três anos após publicação do Marco Legal da GD, agentes pedem nova revisão das regras para redução de subsídios.

A geração distribuída (GD) entrou na mira de agentes do setor elétrico que buscam ampliar o alcance da proposta de reforma elaborada pelo Ministério de Minas e Energia (MME). Embora o texto elaborado pelo governo e em análise na Casa Civil não trate da revisão de subsídios à micro e minigeração distribuída (MMGD), o assunto veio à tona em conversas conduzidas pela pasta com associações setoriais deste a última semana, apurou a MegaWhat.

O objetivo é inserir a GD no “rateio” dos cortes de subsídios da reforma, que inicialmente mira a modalidade de autoprodução e o desconto na tarifa fio concedido a grandes consumidores de energia que compram energia de fontes renováveis.

O governo reconhece que incluir a GD na reforma enfrentaria forte resistência no Legislativo, onde o setor de geração distribuída mantém influência expressiva. “Enxertar este tema na proposta de reforma, corretamente não incluído no texto-base pelo MME, prejudicaria o processo de construção de consenso no SEB e, consequentemente, dificultaria a própria tramitação da reforma no Congresso Nacional”, disse, em nota, Bárbara Rubim, vice-presidente de geração distribuída da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).

A GD, formada majoritariamente por sistemas solares fotovoltaicos, beneficia-se hoje de um modelo de sistema de compensação de créditos que permite a redução ou até zerar a conta de luz dos prossumidores, incluindo componentes tarifários que não dizem respeito diretamente à energia consumida, como encargos setoriais e a tarifa de uso da rede.

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As regras da categoria foram determinadas pela Resolução 482 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em 2012, mas foi apenas depois de mudanças que aprimoraram o sistema de compensação de créditos que a expansão da GD passou a ser significativa. A capacidade instalada saltou de menos de 2 GW, no final de 2019, para quase 40 GW atualmente. Já os subsídios à GD, segundo o subsidiomômetro da Aneel, saíram de R$ 166,9 milhões em 2019 para R$ 11,6 bilhões em 2024. Neste ano, entre janeiro e abril, já são R$ 3,3 bilhões.

Na quinta-feira, 24 de abril, o MME realizou uma reunião com representantes do setor para detalhar sua proposta de reforma, focada, principalmente, na abertura do mercado livre, na ampliação da tarifa social para baixa renda, na limitação da figura do autoprodutor e na redução de subsídios consumidores de fontes incentivadas.

A MegaWhat apurou que desde então, lideranças de associações tem enviado contribuições ao governo sugerindo a inclusão da geração distribuída na revisão de subsídios, argumentando que a manutenção de benefícios concentraria a retirada de incentivos apenas sobre a indústria e os grandes consumidores, aumentando a pressão por uma divisão mais equilibrada dos custos.

Entre as ideias em discussão esta a criação de um mecanismo para que os sistemas de GD passem a contribuir proporcionalmente com o Encargo de Potência para Reserva de Capacidade (Ercap).

O argumento é que a geração solar distribuída, por sua natureza intermitente e descentralizada, aumenta a necessidade de contratação de usinas térmicas para garantir a segurança do fornecimento nos momentos de queda de geração solar — custos que são socializados via encargos com os consumidores, mas que esses mesmos consumidores da GD não pagam integralmente por conta do sistema de compensação de créditos.

Os agentes também defendem antecipação dos prazos de transição previstos na Lei 14.300/2022, conhecida como Marco Legal da GD, que criou um escalonamento para a redução gradual dos subsídios. O direito adquirido daqueles que conectaram os sistemas antes da mudança das regras vale até 2045. Já os empreendimentos enquadrados na regra de transição, por terem protocolado a solicitação de acesso até o início de 2023, contam com o aumento gradual do pagamento do fio até 2029.

A Associação Brasileira de Geração Eólica (Abeeólica), por exemplo, disse ao MME que a lei causa preocupação ao não impor prazo para a entrada em operação dos empreendimentos enquadrados nos benefícios.

“A ausência de um prazo vinculante para a injeção de energia, associada à manutenção de subsídios por longos períodos, tem contribuído para a expansão desordenada da GD, com efeitos adversos sobre o equilíbrio da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), a previsibilidade do planejamento energético e a competitividade entre as fontes de geração”, disse a entidade, na contribuição ao MME, ao qual a MegaWhat teve acesso.

Outras associações foram no caminho parecido, como Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine), Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace) e até mesmo o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).

Ruptura e estabilidade das regras

Enquanto o MME avalia as considerações e pondera se há chance de vencer essa batalha no Congresso, o setor de GD já se mobiliza para evitar as mudanças.

Para a Absolar, o marco legal da GD, de 2022, é muito recente para entrar no âmbito da proposta do governo, até porque ainda não houve tempo para retirada gradual dos subsídios. Além disso, a entidade aponta que a Aneel ainda não concluiu o processo de calculo dos custos e benefícios da MMGD.

“Mudar significativamente as regras da geração distribuída seria uma medida impopular e desalinhada com a transição energética justa e sustentável do Brasil. Assim, é recomendado não incluir o tema na reforma, sob pena de atrapalhar o processo legislativo nas atualizações necessárias, urgentes e bem-vindas para o setor elétrico brasileiro”, disse a entidade.

O presidente da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), Carlos Evangelista, afirmou que qualquer tentativa de antecipar prazos ou de criar encargos sobre MMGD seria uma “ruptura frontal à segurança jurídica, à previsibilidade regulatória e, consequentemente, um grave atentado à credibilidade do setor elétrico brasileiro e à confiança no ambiente de investimentos do país”.

“A quebra unilateral de regras que foram aprovadas há apenas dois anos — e cujos efeitos ainda estão sendo implantados — traria consequências gravíssimas, afastando investimentos não apenas na micro e minigeração distribuída, mas em todo o setor elétrico e em setores estratégicos da economia brasileira”, afirmou Evangelista.

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