A cobrança de uma compensação financeira de 7% do valor da energia produzida por usinas eólicas e solares fotovoltaicas a ser paga aos estados, ao Distrito Federal, aos municípios e aos órgãos da administração direta da União pode gerar custos adicionais ao consumidor e desestimular a indústria brasileira, avaliaram especialistas durante audiência pública da comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, realizada nesta terça-feira, 2 de julho, para debater o projeto de lei (PL) do tema. O problema, segundo os representantes da indústria e dos geradores de energia, é que essa taxa será repassada ao preço da energia elétrica, se somando a outros encargos e subsídios que já oneram a conta de luz.
Na sessão, a deputada Silvia Waiãpi (PL-AP), autora do requerimento da audiência, disse que vai se reunir com o relator, deputado João Carlos Bacelar Batista (PV-BA), para levar os argumentos dos agentes e debater o projeto de lei.
Escalada dos subsídios e encargos
Roberto Wagner Lima Pereira, gerente de Energia, Saneamento e Telecomunicações da Confederação Nacional da Indústria (CNI), destacou a tendência dos encargos no Brasil subirem ao longo dos anos, com impacto sobre a conta de luz. Esta semana, a confederação divulgou estudo no qual aponta que os impostos e os encargos representam um total de 44,1% do valor da conta de luz, sendo distribuídos em 30% para ICMS, PIS/Cofins, e quase 13,5% para custos de encargos, taxas e subsídios do setor elétrico.
“Hoje, no Brasil, o que mais nos preocupa mesmo são os custos estruturais. Pagamos um custo estrutural, que é a conta de desenvolvimento energético (CDE), que é o principal guarda-chuva de subsídios no país, e outros encargos do setor elétrico são muito inerentes ao funcionamento do setor elétrico, além de um custo extra conjuntural, que é relativo às contas Covid e escassez hídrica, dimensionadas até 2027”, falou o gerente, destacando o salto da CDE ao longo dos anos e o custo do Proinfa.
O representante da CNI ainda argumentou que a indústria está preocupada com o custo dos subsídios, que “não está apenas embutido na conta que o consumidor paga, mas em todos os produtos que a indústria nacional comercializa”.
Mário Menel, presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape) e do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase), destacou o impacto deste potencial aumento do preço da energia na competitividade das indústrias, dado o impacto no preço da energia.
“Por exemplo, 70% do custo da produção do alumínio é energia elétrica. Logo, um aumento de 7%,[conforme está previsto no PL], representa, portanto, algo de 5% no aumento do custo do produto. Mas, se for o autoprodutor, ele embute no produto dele e perde competitividade ou ele tira do acionista, que desestimula novos investimentos. Temos que repensar esse nosso projeto, porque ele tem tudo de perverso em termos da competitividade da indústria brasileira”, enfatizou Menel.
Mesmo se as taxas forem absorvidas pelos empreendedores e não repassadas aos preços, isso poderá desestimular o mercado, com reflexo negativo, por exemplo, na produção do hidrogênio, disse Marcello Cabral, diretor de Novos Negócios da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeolica). A indústria eólica, que enfrenta um “momento crítico” e sem crescimento significativo nos últimos anos, seria ainda mais prejudicada.
“Além de gerar emprego para toda a cadeia produtiva, a gente também tem uma peculiaridade: podemos desenvolver atividades e parques perto de agropecuária e não há uma necessidade de desapropriação gigantesca como outras fontes”, disse Cabral.
Na visão do executivo, as eólicas e as solares ajudam a melhorar o índice de desenvolvimento humano de áreas próximas aos projetos e já geram compensação financeira em seus licenciamentos ambientais, que abarcam questões técnicas e sociais.
Constituição
Carlos Dornellas, diretor Técnico e Regulatório da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), disse entender que a determinação do pagamento adicional vai contra a Constituição Federal.
“Opinamos pela inconstitucionalidade da criação de uma compensação pelo uso do potencial solar mediante alteração da Lei n° 7.990/1989, visto que a compensação tem origem na utilização de bem da União para produção de energia elétrica, sendo juridicamente impossível falar-se em semelhante compensação pelo uso da radiação solar, visto que tal recurso, bem ou potencial não está incluso no rol do artigo 20 da Constituição Federal”, disse o diretor da Absolar.
Recurso renovável
Em uma nota técnica divulgada em junho, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) recomendou que não sejam cobrados royalties de projetos de eólicas offshore, já que utilizam um recurso renovável.
“Destaca-se também que os royalties no setor de petróleo e gás natural são, por definição, uma compensação financeira paga à União pelas empresas produtoras de petróleo e gás natural no Brasil como forma de compensar a sociedade pela utilização destes recursos finitos e não renováveis. Portanto, não há sentido em se cobrar royalties de usinas eólicas offshore. Ainda assim, os critérios de bônus de assinatura, participação especial (para projetos de grande porte) e pagamento pela ocupação ou retenção de área (desde o início da cessão, na fase de estudos), podem ser replicados sem maiores dificuldades”, diz a entidade.