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Deputados convocam ministro para explicar MP da Amazonas Energia e negócios da Âmbar

Os parlamentares pedem que Silveira explique os motivos de a MP ter sido publicada dias após a Eletrobras fechar o acordo para venda das termelétricas para a Âmbar.

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Audiência pública para ouvir o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, na Câmara dos Deputados/ Crédito: Lula Marques (Agência Brasil)

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, foi convocado por deputados para prestar esclarecimentos sobre a Medida Provisória (MP) 1.232/2024, que, entre outras questões, viabiliza a transferência de controle da Amazonas Energia ao estabelecer condições para que a concessão supere os problemas financeiros e operacionais e passe a ser sustentável, e resolve o problema da inadimplência de termelétricas da Eletrobras que foram adquiridas pela Âmbar, braço de energia da holding J&F.

A companhia e o ministro, por sua vez, rebateram as acusações, consideradas “especulações” sem sentido.

Na convocação, os deputados pedem que Silveira explique os motivos de a MP ter sido publicada dias após a Eletrobras fechar o acordo para venda das termelétricas para a Âmbar, em um negócio que envolve ainda uma potencial parceria entre as empresas no futuro, caso esta última compre o controle da Amazonas Energia.

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Especulação irresponsável e descabida

À jornalista Daniela Lima, da GloboNews, o ministro declarou que a repercussão é “especulação irresponsável e que a MP é técnica”. A resposta de Silveira foi lida durante o programa Conexão nesta quarta-feira, quando foi informado ainda que o ministro irá se encontrar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva às 16h, para tratar do tema.

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Em nota, a Âmbar disse que as especulações são “descabidas” e não fazem sentido técnico e econômico.

“A Âmbar nunca tratou do tema com o Ministério de Minas e Energia. A MP visa o reequilíbrio econômico e financeiro da distribuidora de energia do estado do Amazonas. Cerca de 30% da energia gerada pelas usinas incluídas na transação é contratada pela Amazonas Energia”, disse a empresa.

A Âmbar disse ainda que “todos os agentes do mercado elétrico” tinham conhecimento de que a solução para a sustentabilidade econômica da Amazonas Energia era “urgente e iminente”, levando à empresa a avaliar que o risco de crédito da distribuidora era temporário.

Conclusão do GT da Amazonas Energia

A percepção estava relacionada à conclusão de um grupo de trabalho (GT) criado pelo governo, formado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), para buscar alternativas para solucionar a questão da Amazonas Energia, que enfrenta problemas estruturais de longa data relacionados às perdas não técnicas elevadas e à presença de muitos sistemas isolados.

Em fevereiro, o GT publicou relatório recomendando três alternativas, sendo que duas delas eram consideradas drásticas e danosas aos consumidores: caducidade da concessão e relicitação, intervenção estatal na empresa e relicitação. A terceira opção seria a flexibilização dos parâmetros regulatórios, para atrair potenciais novos interessados em assumir a concessão, o que dependia de uma mudança na legislação – e que veio na MP 1.232.

“O relatório também apontava para o agravamento da situação da Amazonas Energia justamente a partir de junho, já que as flexibilizações regulatórias oferecidas na concessão da empresa venciam em maio de 2024, piorando ainda mais a saúde financeira da empresa”, reforçou a Âmbar, se referindo ao relatório do GT.

>> Ouça: Amazonas Energia, J&F e os planos do governo para salvar a distribuidora

Requerimentos dos deputados

Em suas convocações, Evair Vieira de Melo (PP/ES) e Marcos Pollon (PL/MS) pedem que o ministro explique por que a medida foi publicada três dias após a compra das usinas da Eletrobras pela J&F e apontam que há suspeitas de favorecimento à empresa.

“A edição da MP, objeto desta convocação, tem a intenção de possibilitar a transferência da Amazonas Energia, para favorecimento, em tese, de uma das empresas do grupo econômico JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, conhecidos cidadãos envolvidos em caso de corrupção nos dois mandatos anteriores do atual governo”, argumentou Pollon.

Gilberto Abramo (Republicanos/MG) também solicitou a presença de Silveira na Casa, questionando o motivo de a medida não ter sido publicada anteriormente e quais as motivações e circunstâncias que levaram à sua edição.

Já Adriana Ventura (Novo-SP) pede ao ministro que explique como foram feitos os estudos para publicação da medida.

Emenda à medida

Congresso Nacional apresentou 74 emendas à MP. Entre os dispositivos, o deputado Altineu Côrtes (PL/RJ) incluiu texto que pode interferir na transferência de controle da distribuidora do Amazonas.

Em sua emenda, Côrtes propõe a adição de um parágrafo em um dos artigos MP, vedando a assunção de controle acionário nas concessões de grupo econômico que tenha adquirido usinas termelétricas de empresas estatais, privatizadas ou ainda sob o controle da União, direta ou indiretamente, no período anterior a dois anos da data da aprovação.

Na visão do parlamentar, se aprovado, o dispositivo pode garantir que nenhum grupo econômico ao adquirir termelétricas possa utilizar sua posição para assumir o controle acionário de distribuidoras que tenham dívidas decorrentes da compra de energia dessas usinas.

“A emenda visa assegurar a integridade do mercado de energia, prevenindo que aquisições de usinas resultem em vantagens indevidas sobre distribuidoras envolvidas na compra de energia”, diz Côrtez.

Âmbar no TCU

Outra polêmica relacionada à empresa de energia dos irmãos Batista resgatada pela imprensa essa semana diz respeito ao Procedimento Competitivo Simplificado (PCS), leilão emergencial realizado em 2021, no qual a Âmbar se envolveu após comprar quatro usinas originalmente contratadas pela Evolution Power Partners (EPP) que somavam 344 MW.

A companhia foi autorizada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a substituir as quatro novas usinas do contrato pela termelétrica Cuiabá, de 480 MW, em operação desde 2001. A condição para isso era de que, mesmo com o atendimento do PCS pela usina existente, as quatro usinas fossem construídas até o início de agosto de 2022, prazo limite dado pelo edital do PCS.

A empresa, porém, não conseguiu o aval da Aneel para iniciar a operação comercial dessas usinas, e vinha costurando desde 2022 um potencial acordo.

Ao assumir o Ministério de Minas e Energia no início de 2023, o ministro Alexandre Silveira solicitou ao Tribunal de Contas da União (TCU) que inaugurasse a Câmara de Solução Consensual com os contratos do PCS, já que havia muitos conflitos devido ao atraso da conclusão dos projetos. A Karpowership do Brasil, por exemplo, foi à Justiça para iniciar a operação das usinas, e já fechou acordo no âmbito do TCU flexibilizando a geração.

MegaWhat apurou que quando a Âmbar comprou os ativos, a Evolution Power Partners, dona original dos projetos, havia encomendado máquinas considerando a potência total, e não o número de turbinas. Por isso, a Âmbar decidiu avançar com as obras com apenas três usinas, considerando que a potência delas combinada era suficiente para cumprir os contratos.

Um pleito para adequação das características técnicas, com base no próprio edital do PCS, foi realizado, mas a Aneel não chegou a deliberar o processo. Como as usinas não entraram em operação, nem em teste, a Âmbar precisou contratar um banco de baterias para fazer o comissionamento das usinas desconectado do grid. Esse teste foi considerado insuficiente pelos auditores do TCU.

Em abril deste ano, o TCU arquivou, sem analisar o mérito, o acordo que seria firmado com a Âmbar Energia. O ministro Benjamin Zymler, relator do processo no TCU, contudo, manifestou ter “certa simpatia com o mérito” da solução costurada com a empresa e o poder concedente, e deixou o caminho aberto para que o acordo fosse aprovado diretamente com o ministério e a agência reguladora.

>> Aneel afirma ao TCU que Âmbar concluiu usinas do PCS e reforça perspectiva de solução consensual

Acordo ainda é possível

O arquivamento do acordo pelo TCU não impede que a solução seja aprovada pelo poder concedente. Os ministros da corte não julgaram o caso porque quando a CSC foi instituída, a unanimidade era uma condição para que qualquer acordo pudesse prosperar. Durante a deliberação, o ministro Benjamin Zymler, relator do processo no TCU, chegou a dizer que o arquivamento pela corte “não implica a vedação da assinatura do termo de compromisso”, o que foi reforçado pelo ministro Antonio Anastasia, que disse que “nada impede que o ministério possa desenvolver novas tratativas”.

“Nós não temos aqui no tribunal o poder de retirar do poder executivo, do poder concedente, a sua capacidade negocial”, disse ainda em abril o ministro Bruno Dantas, presidente do TCU.

Ontem, a revista Piauí informou que o ministro Alexandre Silveira chegou a assinar um parecer em abril favorável à assinatura do acordo, o que ainda não teria acontecido porque ele buscou antes o aval do TCU.