Abertura do mercado livre

TCU aponta falhas na abertura do mercado livre de energia e cobra melhorias

Tribunal fez determinações e recomendações ao MME e à Aneel

Edifício do TCU
TCU - Crédito: Saulo Cruz (Divulgação)

O Tribunal de Contas da União (TCU) identificou falhas no processo gradual de abertura do mercado livre de energia conduzido nos últimos anos, que resultou na liberação para todos os consumidores conectados em alta tensão desde janeiro de 2024.  A auditoria da corte identificou fragilidades no processo, como a inexistência de sistemática de avaliação dos resultados das ações tomadas, a ausência de uma análise mais profunda das regras publicadas pelo Ministério de Minas e Energia, e a demora no aperfeiçoamento das regras da comercialização varejista,  e fez determinações e recomendações ao MME e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

O plenário do TCU votou ontem, 11 de setembro, o resultado da auditoria, quando foi aprovado o relatório do ministro Antonio Anastasia, relator do processo.

No seu relatório, Anastasia avalia que a dispensa de Avaliação de Impacto Regulatório (AIR) no processo de abertura do mercado livre a todos os consumidores do Grupo A está em desacordo com a Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019). O texto considera que há “dúvidas razoáveis sobre riscos não completamente mitigados” como a sobrecontratação das distribuidoras à medida que os consumidores migrarem para o ambiente de contratação livre (ACL).

Assim, para a abertura do mercado livre aos consumidores de baixa tensão, o TCU recomenda que seja feita uma Avaliação de Impacto Regulatório (AIR), no prazo de 120 dias.

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O voto também determina que o MME e a Aneel devem elaborar em 120 dias um plano de ação que verifique o nível de contratação das distribuidoras e estime o impacto financeiro que as migrações de consumidores ao mercado livre causaram ao mercado cativo desde o início da vigência da Portaria MME 514/2018, que reduziu os limites mínimos de carga para consumidores livres.

A partir daí, o plano deve avaliar se a migração ao mercado livre resultou em aumento tarifário aos consumidores que permaneceram no mercado regulado e, se for este o caso, MME e Aneel devem tomar medidas necessárias para sanar o prejuízo.

“Inércia promove riscos ao SEB”

Segundo o voto do ministro, a “inércia” do MME e da Aneel em promover os aprimoramentos regulatórios para a comercialização varejista e simplificação do processo de migração apresenta riscos para consumidores aptos a ingressar no ACL, consumidores cativos e agentes de distribuição e “compromete a previsibilidade necessária ao bom funcionamento do mercado”.

A diretoria da Aneel só aprovou as regras do comercializador varejista em dezembro de 2023, faltando menos de um mês para a abertura do mercado se concretizar, e ainda discute outros aprimoramentos na regulação.

Avaliação de resultados

Uma grande crítica do relatório do TCU está na ausência de sistemática para avaliação dos resultados da abertura do mercado. Faltariam indicadores de desempenho, o que estaria em desacordo com preceitos constitucionais e práticas recomendadas pelo TCU.

Sem indicadores e com a “inércia em proceder com avaliações”, há baixo grau de conhecimento da efetividade do processo de abertura e desconhecimento do nível dos efeitos adversos sobre o ambiente regulado, avalia o TCU.

Assim, o relatório entende ser “salutar o acompanhamento e a avaliação, por meio do estabelecimento de objetivos claros, métricas, indicadores, estudos, análises e outras ferramentas, dos impactos das medidas adotadas e se estas estão indo ao encontro dos objetivos pretendidos no nascimento da política”.

Sem tais indicadores, a abertura do mercado seria um fim em si mesma: “O Ministério se restringe aos efeitos imediatos da abertura de mercado, sem tecer comentários sobre os impactos na eficiência de mercado e em custos de energia nos ambientes de contratação”, diz o relatório.

O TCU também entende que a falta de objetivos e metas específicos para a próxima fase de expansão do mercado livre, para consumidores de baixa tensão, dificulta ainda mais uma avaliação posterior de resultados.

Competição varejista e fiscalização das distribuidoras

O relatório do Tribunal também avaliou as condições de competição entre os agentes varejistas e as informações que devem ser oferecidas aos consumidores de menor carga sobre a contratação de energia no ACL.

O documento identificou que os consumidores relatam dificuldades na relação com as distribuidoras para viabilizar a migração ao ACL, como descumprimento de prazos ou imposições excessivas por parte das concessionárias.

Assim, o relatório do TCU referendado pelo ministro Anastasia determina que a Aneel, em 120 dias, estabeleça “sistemática de acompanhamento periódico para avaliar as condições competitivas do mercado varejista e a efetividade da competição”. A agência também deve elaborar estudo sobre aprimoramentos para garantir o cumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) em relação às informações dos consumidores.

A Aneel também deverá estabelecer um plano de ação para fiscalizar a situação das empresas verticalizadas no setor de energia elétrica, ou seja, as que atuam na distribuição e na comercialização de energia, “incluindo a identificação de possíveis práticas anticompetitivas”.

Para contribuir com a escolha dos consumidores, o relatório do TCU também recomenda o estabelecimento de produtos padronizados entre as varejistas, que possam ser apresentados em um site independente.

Outras recomendações

Ainda que o Comitê Permanente de Avaliação de Impacto Regulatório (CPair) tenha previsto uma Análise de Resultado Regulatório (ARR) por parte do MME para o período entre 2023 e 2026, o TCU entende quer o prazo é amplo demais e representa risco de que a avaliação seja intempestiva. Por isso, recomenda que o ARR seja feito ainda em 2024.

O TCU também recomenda ao MME que apresente os objetivos da política de abertura gradual do mercado de energia elétrica, bem como avaliação de resultados e dos impactos causados pelas medidas presentes nas Portarias MME 514/2018 e 465/2019, “em especial quanto à redução dos custos de energia, explicitando premissas e metodologia e impactos financeiros causados no Ambiente de Contratação Regulada”.

O MME ainda recebeu a orientação de apresentar uma metodologia de avaliação de resultados para a abertura que já aconteceu e para as próximas fases do movimento, contendo metas e indicadores, responsabilidades, premissas e cronograma avaliativo.

Outra recomendação do TCU é que o MME realize estudos e análises para definir a viabilidade e necessidade de criação da figura do Supridor de Última Instância (SUI), definindo suas características, atribuições e contornos jurídico-regulatórios, para posterior regulamentação pela Aneel.