Empréstimos setoriais

TCU cobra 'maior robustez' em estudos de políticas setoriais do MME

Ministro do TCU Jhonatan de Jesus
Ministro do TCU Jhonatan de Jesus acolheu entendimento de que não houve ilegalidades, mas emitiu recomendações ao MME e à CCEE para que evitem novas falhas.

O Tribunal de Contas da União (TCU) não identificou ilegalidades formais ou “erros grosseiros” na operação de antecipação dos recebíveis da Eletrobras para quitar dois empréstimos tomados em nome dos consumidores, mas enxergou falhas no cálculo dos benefícios previstos aos usuários e recomendou que o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) tenham mais cautela e critérios objetivos em futuras ocasiões.

“Expeço ciência das falhas correspondentes ao MME e à CCEE, com vistas à adoção das providências necessárias para prover maior robustez aos futuros estudos fundamentais às políticas setoriais de alto impacto”, disse em seu voto o ministro Jhonatan de Jesus, relator do processo no TCU.

O questionamento ao TCU foi feito pelo senador Rogério Marinho (PL-RS). A operação foi autorizada pela Medida Provisória (MP) 1.212/2024 e gerou polêmica porque os bancos que participaram da transação receberam R$ 285 milhões em remuneração, enquanto a vantagem econômica aos consumidores foi estimada em R$ 46,5 milhões.

Além do senador, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) encaminhou o caso ao TCU para que verificasse a operação, depois que os técnicos da agência encontraram erros nos cálculos sobre o benefício tarifário, inicialmente estimado em R$ 510 milhões. Posteriormente, a CCEE reduziu o ganho líquido a R$ 2,9 milhões, e depois uma nova revisão elevou a R$ 46,5 milhões.

Após longa análise, o ministro Jhonatan de Jesus acolheu o entendimento da Unidade de Auditoria Especializada em Energia Elétrica e Nuclear (AudElétrica) de que não houve “erro grosseiro” na conduta dos agentes envolvidos. Embora a CCEE tenha errado no benefício calculado inicialmente, o critério estabelecido pela MP 1.212 continuou atendido, permitindo a operação.

“No mérito, apesar de acolher o entendimento da AudElétrica de ausência de erro grosseiro, considero que a impropriedade na estimativa inicial conduz à conclusão de procedência parcial das alegações do representante”, disse o ministro Jhonatan de Jesus em seu voto.

Por isso, recomendou que o MME e a CCEE adotem métodos mais consistentes e informações mais confiáveis em futuros estudos, já que esses cálculos servem de base para decisões de alto impacto, como a edição de medidas provisórias e a análise delas pelo Congresso – inclusive a edição da MP 1.212 foi baseada nos cálculos iniciais.

Um empréstimo para pagar outros empréstimos

A MP autorizou o governo a contratar um financiamento mais barato para substituir os empréstimos da Conta-Covid e da Conta Escassez Hídrica, desde que a operação resultasse em ganho aos consumidores. A garantia desse novo empréstimo envolve os aportes futuros da Eletrobras na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para modicidade tarifária. A companhia se comprometeu com esses pagamentos como uma das contrapartidas da sua privatização.

Ainda que o benefício tenha sido de R$ 46,5 milhões, a AudElétrica entendeu que qualquer valor positivo permitiria que a operação acontecesse dentro da legalidade, ainda que o Ministério Público junto ao TCU, representado pelo procurador Júlio Marcelo de Oliveira, tenha entendido que o erro de cálculo inicial foi “grosseiro e prejudicou a análise da política pública”.

A CCEE comparou dois cenários: no primeiro, os consumidores continuariam pagando as parcelas dos empréstimos pela tarifa de energia, com quitação gradual à medida que a Eletrobras aportasse recursos na CDE; no segundo, a quitação seria antecipada com um novo empréstimo, tendo como garantia os recebíveis da Eletrobras.

Segundo a CCEE, a revisão nos valores foi feita depois que informações mais realistas e atualizadas foram utilizadas, como a taxa de desconto usada no cálculo e o fato de que as devoluções dos saldos de reserva não seriam imediatas, mas sim acontecendo ao longo de 12 meses, no ciclo anual dos reajustes das distribuidoras.

Mais adiante, em 2025, o MME refez o cálculo mais uma vez com base em novas previsões de inflação e juros e chegou ao retorno aos consumidores de R$ 132,7 milhões.

Operação teve benefícios

“Diante desse contexto, embora a falha inicial no cálculo seja incontroversa e revele fragilidade nos estudos iniciais, acompanho o posicionamento da AudElétrica no sentido de que sua ocorrência não modificou a conclusão pela viabilidade do desfecho da operação, pois bastaria ser o benefício econômico superior a zero para que o critério objetivo definido na portaria fosse atendido”, votou o ministro-relator.

Em relação à comparação do valor da vantagem econômica com a taxa cobrada pelos bancos, o ministro também acompanhou a AudElétrica, que disse que os valores de R$ 46 milhões e R$ 285 milhões não são comparáveis, já que o benefício foi calculado pela diferença entre o VPL da situação com antecipação da quitação de recebíveis menos o VPL da situação sem a antecipação, já considerando R$ 285 milhões como saída de caixa.

Além disso, o custo total da operação, incluindo o fee dos bancos, equivale a CDI + 2,2% ao ano, enquanto os empréstimos quitados tinham custo de CDI + 3,6% ao ano. Para o ministro Jhonatan de Jesus, a comissão paga aos bancos foi parte da negociação que, no conjunto da operação, reduziu o custo financeiro final para os consumidores.