Navio-sonda NS-42 ODN-II foi posicionado na Foz do Amazonas para perfuração do bloco FZA-M-59, mas saiu da região sem realizar o trabalho por falta de licenciamento ambiental. Entre as"inconsistências técnicas" encontradas pelo Ibama no pedido da petroleira, está a ausência de AAAS.
Navio-sonda NS-42 ODN-II foi posicionado na Foz do Amazonas para perfuração do bloco FZA-M-59, mas saiu da região sem realizar o trabalho por falta de licenciamento ambiental. Entre as"inconsistências técnicas" encontradas pelo Ibama no pedido da petroleira, está a ausência de AAAS.

Regulação

Estudo para explorar a Foz do Amazonas completa 12 anos sem nenhuma avaliação

AAAS é formato criado em 2012, mas ainda não há nenhuma área classificada pelo processo. Dois estudos aguardam avaliação desde 2020.

Navio-sonda NS-42 ODN-II foi posicionado na Foz do Amazonas para perfuração do bloco FZA-M-59, mas saiu da região sem realizar o trabalho por falta de licenciamento ambiental. Entre as"inconsistências técnicas" encontradas pelo Ibama no pedido da petroleira, está a ausência de AAAS.
Navio-sonda NS-42 ODN-II foi posicionado na Foz do Amazonas para perfuração do bloco FZA-M-59, mas saiu da região sem realizar o trabalho por falta de licenciamento ambiental. Entre as"inconsistências técnicas" encontradas pelo Ibama no pedido da petroleira, está a ausência de AAAS. | Agência Petrobras, Acervo Foresea

Em abril de 2012, a portaria conjunta nº 198/2012 do Ministério de Minas e Energia (MME) e do Ministério do Meio Ambiente (MMA) instituiu a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) como instrumento para outorga de blocos exploratórios de petróleo e para o licenciamento ambiental destas áreas.

Mais de doze anos depois, nenhuma AAAS foi emitida pelos ministérios, e a ausência da avaliação é um dos entraves ao licenciamento ambiental para atividades exploratórias da Petrobras no bloco FZA-M-59, na Bacia da Foz do Amazonas, na Margem Equatorial.

“A AAAS é um instrumento de planejamento fundamental, especialmente para novas áreas de exploração em regiões sensíveis. Ela pode fornecer informações essenciais sobre a viabilidade ambiental da exploração na área em questão”, declarou o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) à MegaWhat.

Em meados de julho, o MME anunciou que o decreto para a criação da Comissão Interministerial de Avaliação de Área Sedimentar (CIAAAS) para decidir sobre as primeiras AAAS, das Bacias de Solimões e Sergipe-Alagoas/Jacuípe, seria publicado “em breve” – mas o decreto ainda não saiu.

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Esta comissão irá avaliar o Estudo Ambiental de Área Sedimentar (EAAS) de cada área. Pela portaria conjunta MME-MMA nº 198/2012, o primeiro passo para a emissão de uma AAAS é o EAAS, um estudo multidisciplinar que deve dar subsídios para definir se as áreas são aptas para receber atividades exploratórias, além de elementos para o licenciamento ambiental. Uma vez que o EAAS está concluído, a comissão interministerial deve ser convocada para avaliar o estudo e tomar as decisões pertinentes.

Os EAAS das Bacias de Solimões e Sergipe-Alagoas/Jacuípe foram concluídos em 2020: o da Bacia de Solimões foi feito pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o da Bacia de Sergipe-Alagoas / Jacuípe foi feito pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Desde então, os estudos aguardam a Comissão Interministerial para avançar em direção à AAAS, em um processo que ainda não tem duração clara. Segundo o MME, “é necessário aguardar a publicação de decreto presidencial [que cria a Comissão Interministerial] para esclarecer o conteúdo e os prazos dos trabalhos”.

Por que tanta demora?

Apesar de ter um caráter multidisciplinar, a AAAS não deveria demorar tanto tempo para sair. Esta é a avaliação da advogada Luciana Lanna, sócia da área Ambiental do Vieira Rezende Advogados. “É multidisciplinar e tecnológico, obviamente não é algo trivial. Mas nós temos braços para isso. O MME, o MMA, a EPE são bem aparelhados em relação a equipe técnica, têm todas as condições de desenvolver isso de uma forma razoável”, diz.

Os EAAS existentes foram concluídos em três anos. EPE e ANP realizaram os estudos por meio de empresas contratadas. A EPE publicou o edital do estudo da Bacia de Solimões em setembro de 2017, e concluiu o trabalho em agosto de 2020. A ANP publicou edital para EAAS da Bacia de Sergipe-Alagoas/Jacuípe em outubro de 2017, com conclusão do estudo em julho de 2020. Entretanto, desde então os processos não avançaram para a criação das Comissões Interministeriais.

Para Lanna, falta interesse político para avançar com as AAAS no Brasil, pois o EAAS pode reduzir a área de ação de governantes na medida em que propõe recomendações para as áreas sedimentares e medidas mitigadoras. “É um instrumento de política pública, de planejamento estratégico. Vai reduzir a margem de poder decisório [de governantes]. A AAAS exige uma maior transparência, uma melhor governança e esse é o grande obstáculo para sua adoção no Brasil”, avalia Lanna.

Perguntado sobre o prazo para conclusão das AAAS de Solimões e Sergipe-Alagoas/Jacuípe, o MME se limitou a responder que aguarda a publicação do decreto presidencial para criação da Comissão Interministerial. O MMA não respondeu a nenhum questionamento da reportagem.

Manifestações conjuntas

A portaria que implementou a AAAS em 2012 também estabeleceu uma medida transitória para áreas que poderiam receber atividades de óleo e gás. As manifestações conjuntas MME-MMA seriam a forma de garantir a atividade econômica enquanto a AAAS não fosse concluída.

Em 2017, a resolução nº 17 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) voltou a apontar as AAAS como etapa para o planejamento de outorga de áreas para exploração petrolífera, e indicou as manifestações conjuntas MME-MMA como solução “alternativa” para as áreas que não tenham tido EAAAS ou AAAS concluída.

À MegaWhat, o MME avaliou que a resolução do CNPE reduziu o caráter transitório das manifestações conjuntas. A pasta também acredita que é importante “evoluir esse diálogo, pois existem bacias em que o rito da Manifestação Conjunta pode se mostrar adequado”.

Este não é o entendimento do Ibama. “A possibilidade de admitir atividades exploratórias por meio da manifestação conjunta do MME e MMA é a exceção, não a regra da Portaria Interministerial MME-MMA nº 198/2012”, diz despacho assinado pelo presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, no âmbito das disputas com a Petrobras sobre o licenciamento ambiental do bloco FZA-M-59. “Medidas jurídicas transitórias não podem ser transformadas em regra geral, sob pena de se caracterizar flagrante injuridicidade, numa espécie de estado de exceção permanente”, complementa o documento.

Na mesma portaria, o Ibama avalia ser “inaceitável que a AAAS, instituída há mais de uma década, ainda não tenha sido implementada em bacias sedimentares consideradas novas fronteiras exploratórias e de sensibilidade ambiental já identificadas (…) para as quais já se recomendou a realização dessa avaliação e estudos a ela inerentes”.

As manifestações conjuntas, entretanto, devem permanecer sendo aplicadas. Em junho, a gerente de Projeto da Secretaria-Executiva do MMA Moara Giasson declarou que novas manifestações conjuntas devem sair no segundo semestre.

Segurança jurídica

Para Luciana Lanna, a efetiva adoção das AAAS traria mais segurança jurídica para o setor de óleo e gás – que, hoje, vê o licenciamento ambiental como fator de risco. Segundo a especialista, o EAAS pode propor recomendações de medida mitigadora específica, exigência tecnológica de estudo e monitoramento específicos. “Traria uma certa previsibilidade para o empreendedor”, avalia Lanna.

Pela regulação, a AAAS deve sair antes da oferta de áreas, sendo requisito para os leilões. Também devem constar na avaliação informações socioambientais sobre a região, com subsídios para o futuro licenciamento ambiental.

Assim, o licenciamento é uma etapa posterior, e o fato de uma área ser classificada pela AAAS como apta a receber empreendimentos de óleo e gás não dispensa o licenciamento ambiental e nem significa, necessariamente, que ele será concedido. “Se o Ibama perceber que o empreendedor não está suficientemente preparado, pode não dar a licença, mesmo que a área seja apta”, explica Lanna.

Mesmo assim, as AAAS trariam às empresas mais transparência e um panorama mais seguro sobre os requisitos para cada área, na avaliação da advogada. Dessa forma, os empreendedores poderiam avaliar melhor os riscos antes de solicitar as outorgas, e não apenas na fase de licenciamento ambiental, após os leilões.

PL do licenciamento ambiental

Outra medida que poderia trazer mais segurança jurídica aos empreendimentos em relação às questões ambientais seria a aprovação de uma legislação federal sobre o tema. Atualmente, estados e municípios podem legislar sobre questões ambientais para empreendimentos, o que pode criar contradições entre as esferas, com regulações locais mais ou menos flexíveis que a da União.

É o que acontece, por exemplo, em relação ao fracking, prática para extração de gás não convencional que é proibida por legislações estaduais ou municipais, embora não haja sinalização neste sentido na esfera federal.

“Isso gera um monte de ação direta de inconstitucionalidade (ADI), Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC). O Supremo Tribunal Federal é invadido por essas ações e você acaba fazendo licenciamento ambiental por via judicial”, relata Lanna. A regulamentação federal poderia uniformizar a questão, colocando em normas gerais o licenciamento ambiental, segundo a advogada.

Tramita no Congresso um projeto sobre o tema. O texto já foi aprovado na Câmara, onde tramitou de 2004 até 2021 como PL 3.729/2004. Quando chegou ao Senado, o projeto ganhou outra numeração, PL 2.159/2021. Na casa, está sob relatoria da senadora Tereza Cristina (PP-MS) na Comissão de Meio Ambiente (CMA), onde já recebeu 79 emendas. A CMA, entretanto, se debruçou sobre o PL pela última vez em novembro de 2023.

Em julho, o MME anunciou ter aberto uma consulta pública sobre o tema. Configurada no dispositivo diferente das demais consultas públicas, sem processo específico nem publicação no Diário Oficial da União, a inciativa está envolta em ceticismo. “Tudo que eles estão perguntando, a gente já tem solução jurídica pronta. Já está na Política Nacional do Meio Ambiente, a gente não precisa inventar roda aqui”, avalia Lanna.

Questionado sobre o assunto, o MME respondeu que “as tomadas públicas de contribuições do MME foram criadas para tornar os temas discutidos mais acessíveis, mais transparentes, e coletar sugestões da sociedade de maneira simples, rápida e direta, facilitando uma participação mais ágil e adaptada aos objetivos de cada caso”. Segundo a pasta, o dispositivo é previsto pelo artigo 33º da Lei nº 9.784/1999, que fundamenta a consulta pública.

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