A diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) suspendeu temporariamente as penalidades que seria devidas pela turca Karpowership por atrasos na entrega de quatro termelétricas contratadas no leilão emergencial de reserva de outubro do ano passado, que somam 569 MW de potência. A decisão está condicionada à análise da agência reguladora sobre as excludentes de responsabilidade apresentadas pela companhia como justificativa para os atrasos. Pelo edital, as usinas deveriam ter entrado em operação em 1º de maio.
O processo foi discutido na reunião ordinária dessa terça-feira, 14 de junho, da diretoria da agência reguladora. Não entrou na pauta, contudo, o mérito de um pedido feito por outra empresa vencedora do leilão emergencial de reserva, a Âmbar Energia, do grupo J&F. A companhia pediu para substituir definitivamente as quatro termelétricas contratadas no certame, de 344 MW de potência, pela usina existente Mario Covas, conhecida como Cuiabá. Uma nota técnica do regulador recomendou o indeferimento do pleito, que tem causado polêmica no setor elétrico.
Karpowership em atraso
Segundo a Karpowership, há cinco causas que justificam o atraso e que não estão sob sua gestão: saída de outro agente de uma subestação na qual as usinas serão conectadas; demora na emissão de documentos necessários para implantação das termelétricas; atrasos decorrentes da pandemia, principalmente pelo fechamento de portos na China; necessidades de novos estudos elétricos; e atraso na concessão de licenças ambientais.
As usinas pedem que a assinatura dos contratos de conexão com a rede seja postergada para meados de julho, enquanto garante que as usinas entrarão em operação até 1º de agosto, data limite imposta pelo edital para que os contratos sejam mantidos.
As quatro termelétricas da companhia turca tem o diferencial de serem navios com capacidade de gerar energia, o que facilita seu transporte pelo mundo para as regiões em que forem contratadas. O problema no Brasil está no acesso à rede de transmissão. A companhia trava uma batalha com o Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro pela transmissão passar por área preservada de mangue, na região da Baía de Sepetiba.
Técnicos da Aneel contra pedido da Âmbar
O leilão em questão contratou 1,22 GW em projetos ao preço médio de R$ 1.563,31/MWh, foi motivado pela crise hídrica de 2021 e pela perspectiva de que eventual nova escassez de chuva no país poderá levar a falta de energia para atendimento da carga. Das 17 usinas contratadas, apenas uma entrou em operação no prazo do edital, em 1º de maio.
No caso da Âmbar Energia, a discussão na Aneel se refere à quatro usinas vencedoras do certame e que originalmente pertenciam à Evolution Power Partners (EPP), mas foram compradas pelo braço de energia da J&F. Na semana passada, a empresa conseguiu o aval do regulador para transferir a localização das usinas, antes previstas para Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro, para o Mato Grosso, em área contígua à termelétrica Cuiabá.
Como o atraso acarretaria multa, a Âmbar pediu para cumprir o contrato com a usina Cuiabá, e uma medida cautelar proferida pela Aneel gerou grande insatisfação no setor, principalmente de entidades ligadas aos consumidores de energia, pelo entendimento de que seria contrária ao edital, que estabelecia que apenas usinas novas poderiam participar do certame. A cautelar foi derrubada pela diretora-geral substituta da Aneel, Camila Bomfim, mas o mérito da questão ainda não foi decidido.
Na nota técnica, os especialistas da Aneel rebatem o pedido da Âmbar para que as obrigações das quatro usinas – ainda em construção – sejam assumidas pela UTE Cuiabá, já que o edital vetava a participação de empreendimentos em operação comercial.
Os técnicos rebateram também o argumento da Âmbar de que tal substituição traria economias aos consumidores da ordem de R$ 2 bilhões por ano, por conta da disponibilização maior de potência, de 480 MW, e maior capacidade de sazonalização, com priorização da geração durante o período seco. Segundo o documento, o cenário seria esse caso a formação de preço nos quatro anos do contrato seguisse a tendência de um PLD baixo no primeiro semestre e alto no segundo semestre do ano. Caso a realidade seja outra, e ocorra despacho por ordem de mérito nos primeiros meses do ano, a Conta de Energia de Reserva (Coner) teria que assumir o custo de despacho dessas usinas, com resultado desfavorável rateado entre os consumidores.
A nota técnica também rebateu outro pedido feito pela Âmbar, de que a outorga da termelétrica Cuiabá seja revogada e a usina obtenha nova outorga. Assim, segundo a companhia, ela poderia participar do leilão sem desrespeitar as regras do edital.
“A pretensão da Requerente, na revogação formal da UTE Cuiabá e emissão de nova outorga, em última análise, apenas objetiva sanar questão formal insuperável, qual seja, a impossibilidade de participação da UTE Cuiabá no PCS”, diz a nota técnica.