Por Bruna Mascotte e Guilherme Ferreira
As mudanças climáticas são uma realidade amplamente reconhecida. Mas por que clima importa para as empresas? Alterações nos padrões climáticos trazem à tona riscos físicos para os negócios, como o aumento da frequência e intensidade de enchentes e secas. Ainda, podem trazer riscos de transição relacionados à precificação das emissões ou mudanças na demanda de consumidores[1]. Por outro lado, novas oportunidades surgem em meio à transição para uma economia de baixo carbono. Produtos de menor emissão podem gerar novas fontes de receita, enquanto a migração para fontes renováveis não raro gera redução de custos[2].
Por ter o potencial de impactar as operações e os resultados financeiros, a atuação das empresas frente às mudanças climáticas está cada vez mais sob o olhar atento de investidores, notadamente diante da tendência de investimentos sob a ótica ESG – sigla em inglês para aspectos ambientais, sociais e de governança. Neste novo contexto, empresas respondem à pressão de formas diversas, mas há uma clara tendência a compromissos de neutralidade de emissões.
Empresas carbono intensivas, como os setores de O&G e de mineração, já assumiram metas de neutralidade de emissões. A Vale, por exemplo, reduzirá em 33% as emissões operacionais até 2030 e pretende atingir a neutralidade até 2050, em linha com o Acordo de Paris[3]. Nestes casos, apesar da maioria das metas abrangerem apenas as emissões de escopo 1 e 2, estas já representam desafios vultosos devido à complexidade de suas operações e à escassez de tecnologias competitivas no curto prazo.
Dito isso, o que significa ser uma empresa carbono neutra? De forma simplificada, significa que a empresa voltará seus esforços para a redução de emissões, por exemplo via substituição de fontes fósseis por renováveis, eficiência energética, eletrificação e adoção de tecnologias como captura e armazenamento de carbono (CCS, em inglês). Adicionalmente, para as emissões que não forem passíveis de redução, seja por questões econômicas ou tecnológicas, adota-se a compensação de emissões, por meio do sequestro de carbono via captura direta, bioenergia + CCS, florestas, e compra de créditos em mercados regulados ou voluntários.
Entretanto, na prática, a compensação de emissões enfrenta alguns desafios, notadamente no que diz respeito ao uso de créditos de carbono, os chamados offsets. Há questionamentos sobre a padronização e estabelecimento de um mercado global. Os principais desafios giram em torno da dupla contagem, seja na relação país/empresa ou vendedor/comprador de créditos, assim como no uso de florestas, onde torna-se necessária a comprovação de desmatamento evitado e adicionalidade de área plantada. Espera-se que o avanço das discussões no âmbito do Artigo 6 do Acordo de Paris[4] e de iniciativas voluntárias traga maior clareza quanto ao papel da neutralização.
Para o Brasil, metas de neutralidade podem gerar diversas oportunidades visto que o país já conta com abundância de fontes renováveis e outros ativos de baixo carbono. Porém, para alavancar ainda mais seu potencial de gerador de créditos, o país deve engajar-se em discussões globais em busca da valorização de serviços ecossistêmicos e da floresta em pé, garantir o combate efetivo ao desmatamento ilegal e enfatizar o papel do reflorestamento nos compromissos climáticos de neutralidade de emissões.
Bruna Mascotte é sócia da Catavento Consultoria. Mestre em Macroeconomia e Finanças pela PUC-Rio (Departamento de Economia, 2020), administradora formada pelo Ibmec-RJ (2015), tendo cursado 6 meses na Université de Grenoble II, na França.
Guilherme Ferreira é sócio da Catavento Consultoria. Pós-graduado em Gestão de Negócios pela Fundação Dom Cabral – RJ (2020). Engenheiro de produção formado pela PUC-Rio (2018), com certificado de domínio adicional em Empreendedorismo, cursou um ano da graduação na Mercer University, em Atlanta, Estados Unidos.
[1] Catavento Consultoria. Riscos climáticos nos negócios: por um melhor entendimento e maior transparência. 2017. Disponível em: http://catavento.biz/papers/climate-risks-in-business/
[2] Financial Stability Board. Final Report: Recommendations of the Task Force on Climate-related Financial Disclosures. 2017
[3] Vale. Portal ESG: Mudanças Climáticas. Disponível em: http://www.vale.com/esg/pt/Paginas/MudancasClimaticas.aspx
[4] O Artigo 6 trata da regulação internacional de mercados de carbono.
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