Opinião da Comunidade

Charles Lenzi escreve: Diversidade da nossa matriz elétrica e preço da energia

Charles Lenzi escreve: Diversidade da nossa matriz elétrica e preço da energia

Por: Charles Lenzi*

Após o resultado de mais um leilão de energia nova A-4, realizado em 27 de maio de 2022, que contratou 84,1 MW médios de PCHs e CGHs, volta à tona a discussão sobre a competitividade das fontes e a diversificação da matriz elétrica brasileira.

Nosso país é privilegiado pela abundância de recursos naturais, o que possibilita planejar a expansão de nossa matriz elétrica de forma predominantemente limpa e renovável. Água, sol, vento e biomassa garantem, principalmente por sua complementariedade, uma geração de energia elétrica competitiva e confiável.

Ao se falar de custos, é preciso diferenciar o que é custo de geração de cada fonte daqueles custos que são imputados na tarifa paga pelos consumidores. Nos leilões de energia nova, a custos de comparação são aqueles necessários para construir os empreendimentos. Ou seja, os preços de energia comparados são, em linhas gerais, fruto dos investimentos em equipamentos, obras e despesas de financiamento destinados à construção das usinas. Dividindo-se este montante de recursos pela quantidade de energia que esses empreendimentos vão produzir, tem-se, de forma resumida o preço da energia por MWh. Algumas fontes requerem maiores investimentos para construção das suas usinas do que outras. Produzem um preço por MWh maior, mas isso não significa que ainda sejam as mais caras quando se considera a tarifa paga pelos consumidores finais.

Isso se deve a outros custos necessários para a operação do sistema elétrico brasileiro. A Abragel (Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa) entende que assegurar uma correta alocação dos custos que são inseridos no sistema por cada agente, combinada com uma adequada definição e valorização dos atributos das diversas fontes são aspectos fundamentais para proporcionar isonomia e equilíbrio entre os agentes de geração.

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Além disso, deve-se precificar os investimentos necessários para o escoamento da energia gerada pelas diversas fontes. Por exemplo, a concentração de geração eólica e solar, nos estados da região nordeste, tem forçado o planejamento a aumentar a expansão da rede básica. Contudo, o incremento dos custos de transmissão, nos últimos 10 anos, para suportar exclusivamente esta geração foi da ordem de R$ 50 bilhões, isto implica em um custo adicional no preço da energia gerada por estas fontes em operação de cerca de 80 R$/MWh. Este custo não está alocado diretamente nestas fontes, mas está sendo pago por todos os consumidores nacionais. Estudos feitos pela EPE estimam investimentos de outros R$ 50 bilhões para a construção de 13.730 km de linhas de transmissão, e de subestações associadas, para escoar a energia de usinas fotovoltaicas e eólicas das regiões norte e nordeste para o centro do país. Incluído neste valor, está o Leilão de Transmissão de 2022 destinado a escoar a energia solar fotovoltaica produzida no norte de Minas Gerais para a região Sudeste, com custos estimados em R$13 bilhões em linhas de transmissão e subestações. Estes investimentos terão receitas anuais permitidas da ordem de R$ 1,8 Bilhão/ano em concessões de 30 anos, o que para o montante de energia previsto pela EPE, deveria resultar em um custo adicional para escoamento desta energia da ordem de 110 R$/MWh que, obviamente, não serão alocados aos custos de geração, mas sim rateados por todos os usuários do sistema de transmissão.

Não há que se falar de uma precificação real e justa da energia sem que possamos incluir os custos implícitos de infraestrutura para que essa energia chegue aos consumidores de forma confiável e segura. A vida útil dos empreendimentos é um outro aspecto que deveria ser considerado nesta equação. As centrais hidrelétricas têm vida útil superior a 100 anos. Outras fontes renováveis têm vida útil entre 15 e 25 anos. Para a mesma capacidade instalada, num período de 100 anos, uma fonte renovável não hídrica precisa realizar o mesmo investimento quatro vezes. Esta característica é única das hidrelétricas. Após o fim da concessão ou autorização, em geral 35 anos, o bem é revertido à União, se tornando um ativo que pode operar por mais 70 anos e com todos os investimentos já amortizados.

É preciso considerar um planejamento integrado de recursos de forma a alocar todos os custos corretamente. Não se discute a importância das fontes renováveis intermitentes e mesmo dos projetos estruturantes, mas é fundamental que os custos das ampliações dos sistemas de transmissão para escoamento de grandes blocos de energia destas instalações sejam parcialmente alocados nos próprios empreendimentos, fazendo com que o valor da energia produzida por eles esteja mais próximo da realidade que o consumidor percebe na sua conta.

Por outro lado, importantes atributos das usinas hidrelétricas de pequeno porte (CGHs, PCHs e UHEs até 50 MW) ainda não são considerados na formação de preço. Essas fontes, além de gerarem energia limpa, renovável e segura, com tecnologia 100% nacional, têm a vantagem de estarem descentralizadas, espalhadas por todo o território brasileiro e mais próximas aos centros de consumo. Assim, não demandam investimentos, como mencionado, de extensas linhas de transmissão para escoamento da energia.

No médio e longo prazos, existe potencial suficiente para construção de mais de 1.000 hidrelétricas de pequeno porte, o que representa aproximadamente 13.000 MW. Isso significa mais energia firme injetada em nosso sistema, a preços mais realísticos e justos para a sociedade. Portanto, a adequada valorização de cada fonte conforme seus atributos é valorizar a riqueza da diversidade de nossa matriz elétrica, conferindo isonomia aos agentes em um ambiente de mercado saudável e seguro.

Por fim, cabe destacar que de 2015 para cá foram contratados, através dos leilões de energia, 11.480 MW de capacidade instalada de fontes renováveis. Desse total, 46% foram de fonte eólica, 26% de fonte solar, 16% de biomassa e 13% de centrais hidrelétricas de pequeno porte.

* Charles Lenzi é presidente executivo da Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel).

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