A retomada das obras civis da usina nuclear de Angra 3, de 1.405 MW de capacidade de instalada, pela Eletronuclear apresenta riscos, segundo a área de auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU).
Na análise, a equipe aponta que há risco de inadequação na integração das obras da linha crítica com outros serviços e fornecimentos que contemplam a fase 1, bem como de integração com o futuro EPCista (sigla em inglês para Engineering, Procuremnt, Construction), visto que existem contratações previstas que podem afetar a montagem do reator, podendo gerar atrasos na execução das obras.
A fase 1 é responsável pela contratação de serviços para aceleração da linha. Já a linha crítica tem o objetivo de antecipar as atividades prioritárias de retomada do empreendimento para a futura contratação do EPCista, responsável pela conclusão.
Também foram verificados riscos na fiscalização, na supervisão e no gerenciamento do contrato de serviços para prestação da obra e baixa efetividade do plano de fiscalização da Eletronuclear.
“Na análise do plano de fiscalização [da Eletronuclear] pela equipe de auditoria constatou-se que o citado plano foi elaborado de forma insuficiente, já que contemplava apenas uma parcela das atividades abarcadas pela fiscalização de uma contratante em obras que visam a execução de obras e serviços de engenharia”, destaca o ministro Jhonatan de Jesus.
De acordo com o magistrado, o plano em questão descreve os procedimentos de fiscalização relacionados às medições e respectivos pagamentos, como a emissão da ordem de execução, confecção do relatório de acompanhamento da ordem de execução pela contratada, critérios para a elaboração das medições executadas, bem como os formulários que serão utilizados pela contratada e encaminhados à estatal.
Entretanto, “negligencia” outros tópicos considerados importantes pela área técnica do TCU, como a manutenção e atualização do arquivo, a realização de reuniões periódicas para analisar o andamento das obras e serviços, soluções de dúvidas relacionadas à execução dos serviços e demais procedimentos necessários para a execução do contrato, mitigando também os riscos de ocorrência de atrasos na sua conclusão.
“Este cenário não permite asseverar que o início das obras civis da linha crítica da usina será de acordo com o cronograma detalhado de execução, justificando a necessidade de um plano de fiscalização completo e detalhado. [Por isso], considero oportuna a recomendação proposta no sentido de que a Eletronuclear apresente as medidas apontadas pela unidade técnica para complementação do tão mencionado plano de fiscalização”, conclui o ministro.
Após as constatações da área, o Tribunal recomendou à Eletronuclear que consolide, em um plano de fiscalização ou outro instrumento equivalente, as medidas que serão adotadas pela estatal associadas à fiscalização do contrato decorrente do edital.
Obras Angra 3
As obras de Angra 3 começaram em 1981, mas em decorrência de ineficiências, ausências de recursos, rescisões contratuais e investigações de corrupção no âmbito da Lava Jato, foram retomadas e interrompidas reiteradas vezes, sendo que a última paralisação ocorreu em 2015.
Em julho deste ano, a Eletronuclear, dona da usina, informou que estava retomando as obras, por meio do Plano de Aceleração do Caminho Crítico de Angra 3, conjunto de obras de engenharia que antecedem a contratação de um epecista para concluir a usina, cuja contratação ocorreria até 2024, mas dependeria de modelagem do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que determinaria os investimentos necessários e a melhor forma de retomar o empreendimento na totalidade.
Os valores definidos pelo banco depois seriam analisados pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e pelo TCU.
Em agosto, o governo federal incluiu a análise sobre as obras para conclusão da usina de Angra 3 no pacote do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O portfólio do programa, contudo, não prevê a conclusão do projeto, apenas a realização de “estudo de viabilidade técnica, econômica e socioambiental” das obras da usina.
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Já em setembro, a 2ª Vara Cível da Comarca de Angra dos Reis suspendeu as obras sob a justificativa de que mudanças foram feitas no projeto inicial e que ocorreram atrasos no repasse financeiro da cessão do terreno. No mesmo período, a Eletronuclear informou que iria recorrer da decisão na Justiça e que as obras estavam paralisadas.
Localizada no município de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, o projeto integrará o complexo da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA) , que inclui a UTN Angra 1 (657 MW) e a UTN Angra 2 (1.350 MW) , ambas em operação. Angra 3 tem previsão para entrar em operação no início de 2028.
Importância
Sob o enfoque do atendimento energético, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) considera que a UTN Angra 3 apresenta características para atendimento da região Sudeste e do Sistema Interligado Nacional (SIN) pela sua capacidade instalada, o que pode contrituir para evitar congestionamentos nas interligações entre subsistemas.
Além disso, o Operador considera que a usina pode manter a qualidade do suprimento em situações de parada das UTNs Angra 1 e Angra 2, para recarga ou manutenções; aumentar os limites de transmissão para a área Rio de Janeiro/Espírito Santo, minimizando a necessidade de geração térmica; e trazer um melhor perfil de tensão em malhas de 500 kV e 440 kV da região Sudeste.
Segundo o TCU, diante deste contexto, a usina traz uma alta disponibilidade e confiabilidade para o SIN, por não depender de vazão de rios, ventos e sol, “o que faz de Angra 3 um dos principais recursos do subsistema Sudeste/Centro-Oeste”.
O Tribunal ainda considera que, com uma disponibilidade na ordem de 90%, Angra 3 pode suprir a necessidade de cerca de 5 milhões de residências, além de acrescentar 7,2% na energia armazenável máxima do sistema, equivalente a aproximadamente 1,8% da carga do Sistema Interligado Nacional ou, ainda, cerca de 3,2% da carga do Sudeste, conforme dados do ONS relativos ao ano de 2021.
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O TCU também acredita que como a usina está localizada próxima dos centros de consumo pode ajudar a evitar congestionamento nas interligações entre subsistemas, trazendo segurança e reduzindo as chances de queda de carga, os chamados ‘apagões’.