Opinião da Comunidade

Antonio Carlos de Carvalho escreve: CIGRE-Brasil, um think thank para discutir o futuro do setor elétrico

Por: Antonio Carlos C. de Carvalho* O III Fórum de CEOs, realizado durante o XXVII Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica (SNPTEE), abrigou uma importante iniciativa, considerando-se o momento de transformações em que se encontra o setor elétrico brasileiro. O evento reuniu 25 executivos de importantes empresas do setor eletroenergético brasileiro para discutir os desafios atuais e futuros que se apresentam. O objetivo foi propor sugestões para atuação do CIGRE-Brasil como think tank de apoio ao setor e contribuir para que os obstáculos sejam superados.

Antonio Carlos de Carvalho escreve: CIGRE-Brasil, um think thank para discutir o futuro do setor elétrico

Por: Antonio Carlos C. de Carvalho*

O III Fórum de CEOs, realizado durante o XXVII Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica (SNPTEE), abrigou uma importante iniciativa, considerando-se o momento de transformações em que se encontra o setor elétrico brasileiro. O evento reuniu 25 executivos de importantes empresas do setor eletroenergético brasileiro para discutir os desafios atuais e futuros que se apresentam. O objetivo foi propor sugestões para atuação do CIGRE-Brasil como think tank de apoio ao setor e contribuir para que os obstáculos sejam superados.

No encontro, houve plena concordância entre as lideranças em relação ao fato de que a transição energética constitui um dos principais desafios com que se depara o setor elétrico brasileiro. No segmento, a transição energética está se desenvolvendo por meio da inserção de fontes renováveis na matriz, o que amplia a participação de fontes de geração intermitentes. Números recentes divulgados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) dão uma amostra das proporções desse movimento: entre janeiro e outubro deste ano, foi adicionada ao sistema elétrico brasileiro uma capacidade instalada de 7,8 mil MW em novos empreendimentos de geração, dos quais 7 mil MW (quase 90%) são proporcionados por usinas eólicas e fotovoltaicas.

Essa característica da expansão do sistema indica que o país está no rumo certo da transição energética, considerando-se que as novas usinas fotovoltaicas e eólicas serão essenciais para que atinjamos o net-zero nas emissões líquidas de carbono até 2050. Mas, do ponto de vista da operação do sistema, a crescente participação na matriz elétrica de fontes com geração intermitente inspira cuidados. Demanda, por exemplo, a necessidade de iniciativas que garantam a segurança e a confiabilidade do sistema elétrico. Exige, também, uma reflexão sobre princípios e critérios para o despacho energético considerando a nova configuração da matriz elétrica.

A eletromobilidade, outro vetor da transição energética, também apresenta desafios para o setor elétrico brasileiro. A rápida expansão do uso de carros elétricos amplia a pressão pela oferta de energia limpa, essencial para que essa opção na substituição da frota movida a combustíveis fósseis tenha a eficácia esperada na redução de emissões de gases de efeito estufa. Esse novo componente no consumo de energia deverá demandar tomadas rápidas de decisões, de forma a garantir que o crescimento desse mercado se dê de forma ordenada e sem sobressaltos.

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Outro ponto de atenção identificado pelos executivos é o desenvolvimento e produção do hidrogênio verde. O energético é considerado uma das grandes promessas para a substituição dos combustíveis fósseis e, por isso, motiva vários países a buscarem formas de viabilizar a sua produção e estabelecer regras para a sua comercialização. Contando com a vantagem de dispor de uma oferta considerável de fontes renováveis, condição essencial para a produção do hidrogênio verde, o Brasil está entre esses países.

Para os CEOs reunidos pelo CIGRE, o Brasil pode aproveitar a experiência do Proalcool – Programa Nacional do Álcool, que, nos anos 70, em meio aos choques do petróleo, permitiu ao país desenvolver um sistema de produção de etanol carburante e contar com uma frota de veículos movidas com o combustível, o que aliviou a pressão imposta pela oferta reduzida do petróleo pela Opep. A experiência garante ao país até hoje posição de destaque no mercado internacional de biocombustíveis.

Nenhum desses passos importantes da transição energética será possível, contudo, se a regulação dessas novas alternativas não for definida com agilidade. Os CEOs acreditam que a abordagem a esses novos caminhos para a transição energética deverá também exigir, na definição dos novos arcabouços regulatórios, uma visão mais acolhedora para as novas tecnologias e fontes de energia, facilitando a sua inserção na matriz elétrica. Essa postura permitirá maior segurança para novos investimentos em inovação e em novas tecnologias.

Outra iniciativa importante para garantir que a transição energética se dê de forma eficaz será superar as limitações existentes na qualificação profissional. O setor elétrico brasileiro já se ressente da falta de mão de obra especializada, lacuna que demanda a criação urgente de programas de formação e treinamento que permitam a passagem do bastão do conhecimento envolvendo tecnologias tradicionais a novas gerações, além de estimular e desenvolver novas habilidades para garantir a inserção de novas tecnologias.

Tendo como missão promover a produção, o compartilhamento e a disseminação dos conhecimentos técnicos no setor elétrico, o CIGRE-Brasil poderá contribuir para a superação dos desafios. Como bem destacou o Fórum de CEOs, a entidade tem um reconhecido papel de estimular o desenvolvimento de saberes e de propor soluções para o sistema elétrico brasileiro, por meio de fóruns, eventos ou grupos de trabalho, reunindo em torno de mesas de discussões os agentes, indústria e academia. Qualificar o debate será fundamental para que as respostas estejam à altura das transformações que teremos de empreender nos próximos anos. Essa forma de atuar será particularmente necessária na atual conjuntura, marcada pela necessidade de se promover a transição energética.

Com mais de 1 mil associados individuais e corporativos, o CIGRE-Brasil tem o papel de identificar temas relevantes, que possam redundar em novos grupos de trabalho, impulsionando a inovação. Somos indutores do aprimoramento e do desenvolvimento das normas técnicas brasileiras e internacionais e podemos atuar como propositores de estratégias nacionais para o Setor Elétrico.

Para a atuação da CIGRE, o III Fórum de CEOs considera necessária maior ênfase na divulgação do conhecimento adquirido nos 16 Comitês de Estudo formados pela instituição. Isso envolve a necessidade de estabelecer canais de comunicação mais efetivos, com participação intensa nas mídias sociais, de forma a atrair jovens profissionais para o debate técnico-científico. As lideranças do setor sugerem, juntamente com um posicionamento estratégico como hub de conhecimento sobre o setor elétrico, a criação de programas permanentes de disseminação de saberes, qualificação e treinamento profissional.

Atrair as novas gerações de profissionais para a discussão sobre como o país realizará a sua transição energética é vital para que essa jornada chegue a um bom termo. As metas da transição energética são geralmente projetadas para os horizontes de 2030 e 2050. Os jovens profissionais de hoje é que vão construir o futuro do setor.

*Antonio Carlos C. de Carvalho graduou-se em 1978 em engenharia elétrica dos sistemas de potência na UFRJ, obteve grau de Mestre na COPPE/UFRJ, 1984, e MBA no IAD da PUC-RJ, 2009. É membro ativo do CIGRE desde 1982. Coordenou diversos grupos de trabalho nacionais e internacionais. Trabalhou por 13 anos no Cepel e na ABB por 11 anos. Em 2004 transferiu-se para ONS na engenharia da transmissão, até 2017. Posteriormente, atuou como gerente executivo da área regulatória e de relacionamento com os agentes. Ao final de 2021 tornou-se sócio da Ativa Engenharia em consultoria em sistemas de potência.

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