O atraso do Ministério de Minas e Energia (MME) em publicar o decreto de renovação das concessões das distribuidoras dificulta as perspectivas do setor em realizar investimentos no longo prazo, segundo Gustavo Estrella, CEO da CPFL Energia.
Hoje a CPFL possui 14% de participação no segmento de distribuição do país. As distribuidoras CPFL Paulista, CPFL Piratininga, CPFL Santa Cruz e RGE atuam nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraná.
Com contratos vigentes até novembro de 2027, a CPFL Paulista é uma das 21 distribuidoras que aguardam a publicação da pasta. A decisão do poder concedente era esperada até 17 de janeiro deste ano, 18 meses antes do término do término do contrato da primeira distribuidora da lista, a EDP Espírito Santo. Contudo, apesar do atraso e em entrevista recente, o ministro de Minas e Energia Alexandre Silveira afirmou que está dentro do prazo legal.
“Hoje, na média, o setor de distribuição investe mais de R$ 30 bilhões por ano. A CPFL, por exemplo, tem um capex estimado para os próximos cinco anos de R$ 28 bilhões. É um investimento muito alto e que só acontece se tivermos, obviamente, uma perspectiva de longo prazo de concessão. Estamos atrasados nesse processo e espero avanços para trazer de volta essa perspectiva, para que a gente tenha, de fato, condições de operar o setor da forma como deve ser feito”, disse Estrella, durante teleconferência com investidores para divulgação dos resultados.
Congresso nas renovações
Questionado sobre a possibilidade de assumir a concessão da Enel São Paulo, caso sejam tomadas medidas para encerrar o contrato da distribuidora, Estrella afirmou que, na visão dele, a atual regulação do segmento não abre margem para perda de concessão de nenhuma distribuidora.
“Temos uma regulação hoje e acho que não há nenhum embasamento técnico para algum player perder a concessão, inclusive a Enel. Acho que do ponto de vista regulatório é muito negativo para o setor, sinceramente, espero que isso não aconteça”, disse o executivo.
A Enel São Paulo tem enfrentado ações que pedem o cancelamento do seu contrato de concessão pela prefeitura estadual, pela Assembleia Legislativa do estado e pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), principalmente após o apagão de novembro do ano passado, quando a companhia entrou “na mira” por demorar para retornar o atendimento. A suspensão do serviço ocorreu depois de um forte temporal atingir sua área de concessão, provocando queda das árvores.
Para Estrella, todas as distribuidoras estão sendo afetadas em algum grau pelos eventos climáticos extremos, assunto este que entrou nas pautas, assim como a renovação das concessões, de outras entidades além do MME.
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Como exemplo, o executivo citou a “grande participação” do congresso nacional, principalmente da Câmara dos Deputados. Para Estrella, os temas ganharam espaço na Casa devido à pressão sobre a qualidade de serviços das distribuidoras.
“Acho que esse desejo da Câmara, de ver no processo de renovação uma exigência de qualidade de operação das distribuidoras, seja, talvez, uma pré-condição para um processo de renovação. Hoje, temos uma realidade diferente do que tínhamos há dez anos, quando a gente assinou os nossos contratos de concessão atuais. Acho natural a discussão para adequar à nova realidade”, afirmou o executivo.
Ainda sobre o tema, Estrella disse que quando novas regras forem publicadas, as distribuidoras poderão “jogar o jogo novo”, mas enquanto isso não ocorre, a empresa defenderá a estabilidade regulatório, o cumprimento de regra e a previsibilidade.
Leilão de transmissão
Em relação ao primeiro leilão de transmissão, marcado para 28 de março, o CEO afirmou que companhia identificou alguns lotes interessantes, porém ainda aguada a aprovação interna.
“O fato é que seguimos com a nossa estratégia inalterada. Temos expectativas de retorno, de mensuração e de mitigação de risco. Independente da competição, seguimos com a nossa estratégia e eu tenho uma expectativa, talvez mais positiva, de encontrar uma oportunidade de investimento nesse leilão”, falou Estrella.
Preços
A CPFL está prevendo o mesmo cenário que outros players do setor e projeta um aumento nos preços de energia. Segundo Ricardo Motoyama, diretor de mercado da empresa, a expectativa é que o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) alcance R$ 140/MWh no segundo semestre do ano.
“O período úmido foi frustrante entre 2023 e 2024. Temos uma expectativa de um segundo pior período úmido da história e isso pode acarretar preços mais elevados. Caso os patamares de MLT [Média de Longo Termo] fique até 80% vemos preços baixos, ainda que, eventualmente, um pouco acima do piso, mas não em patamares como está sendo negociado no mercado. Por outro lado, se essa frustração continuar, esperamos para janeiro e fevereiro de 2025 um MLT de até 65%, subindo os preços para patamares próximos de R$ 180 MW/h.
Curtailment de eólicas
Na conferência, Estrella informou que a CPFL sofreu uma variação negativa de 1,4% na geração eólica em relação ao período anterior, chegando aos 1.212 MW, devido às restrições de curtailment do Operação Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Caso a restrição não ocorressem, a companhia projetou um aumento de 7,1% na geração, alcançando 1.316 MW. O curtailment é um termo do para redução deliberada da geração das renováveis para equilibrar a oferta e a demanda, seja por falta de demanda, seja por gargalo de transmissão.
Os corte começaram após o apagão de agosto de 2023 e estão sendo tratados pela companhia judicialmente, segundo Karen Luchesi, diretora de Operação de Mercado. Além do âmbito judiciário, a executiva destacou que uma discussão judicial em relação à regra de ressarcimento dos cortes está em discussão na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
De acordo com Luchesi, os cortes continuam acontecendo ainda, mas em um patamar menor.
“Tem uma discussão já judicial, com base em liminar, e o processo segue no judiciário. O que a gente espera é um encaminhamento correto, do ponto de vista regulatório, para não seguirmos mais com dispositivos judiciais”, destacou.
Resultados
A CPFL contabilizou lucro líquido de R$ 1,33 bilhão no quarto trimestre de 2023, queda de 3,5% na comparação com o mesmo período do ano anterior.
O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) somou R$ 3,11 bilhões, um recuo de 18,2%. Já a receita operacional líquida foi de R$ 10,54 bilhões, redução de 1,8%.