Solar

Ligando os pontos: respondemos as principais dúvidas sobre micro e minigeração distribuída

Taxar o sol? Acabar com subsídios? Perguntas e respostas para esclarecer pontos da discussão do momento

* Colaboraram: Camila Maia e Fábio Couto

O uso da expressão “taxar o sol” ganhou força nas redes sociais e na imprensa nas últimas semanas. O que começou como um movimento de empresas e fornecedoras de serviços para micro e minigeração distribuída de energia elétrica, ganhou a opinião pública e trouxe a distorção do real conceito da proposta de revisão da Resolução Normativa 482/2012, cujo período de consulta pública foi encerrado em 30/12/2019.

Os conceitos e propostas do setor elétrico não costumam ser simples, por isso, a expressão “taxar o sol”, apesar de distorcida em relação ao que é proposto pelo regulador, foi um dos caminhos utilizados para alcançar toda a população. No entanto, cabe explicar que o intuito é a retirada de subsídios cruzados, que são aplicados desde 2012, e estavam previstos para serem revisados desde 2015, sendo que a decisão foi postergada para 2019.

Com base na análise das últimas publicações e comentários na imprensa e redes sociais, a MegaWhat elaborou uma sequência de perguntas e respostas para ajudar a elucidar algumas dúvidas. Confira:

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1 – Qual é o papel da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel)? 

A Aneel é uma autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME) e tem, entre as suas atribuições: regular a geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica; fiscalizar as concessões, permissões e serviços de energia elétrica; e dirimir as divergências, na esfera administrativa, entre os agentes, bem como entre esses agentes e os consumidores. Dessa forma, busca promover decisões com equilíbrio e isenção entre os agentes do mercado.

2 – Qual o processo de decisão da agência? 

Com a publicação da Lei nº 13.848/2019, que dispõe sobre a gestão, a organização, o processo decisório e o controle social das agências reguladoras, houve a redefinição do escopo dos instrumentos utilizados até então para instituir um novo instrumento regulatório – texto final de norma, Relatório de Análise de Impacto Regulatório (AIR), Avaliação de Resultado Regulatório (ARR), Editais, e/ou Contratos de Concessão.

Assim, a agência reguladora colocou em seu processo a tomada de subsídios, para a coleta de dados e informações sobre o tema que será deliberado num momento inicial. Além do envio de contribuição pelos interessados, pode contar com a realização de reuniões técnicas (presenciais ou via internet).

Num segundo momento, a agência estabelece um período de consulta pública com a minuta do instrumento regulatório para apreciação da sociedade por meio contribuições documentais; depois instaura período de audiência pública, a fim de receber contribuições presenciais para manifestação oral em sessão pública – aumentando o espaço para participação da sociedade.

As consultas e audiências são realizadas durante determinado período, com possibilidade de prorrogação ou novas sessões, em caso de alto interesse, complexidade ou relevância do tema.

Encerrado o período de consulta ou audiência, a área técnica da Aneel se reúne para estudo e análise técnica das contribuições, conforme o segmento de atuação.

Depois, o tema é enviado para deliberação de diretoria em reunião pública (com acesso livre ao auditório da agência e transmissão ao vivo pela internet, às terças-feiras), em que há possibilidade de sustentação oral dos interessados – independentemente da posição e segmento de atuação; por fim, a publicação da decisão no Diário Oficial da União.

Na reunião, o diretor-relator de um determinado processo lê seu voto e a votação é aberta – a decisão é colegiada. A diretoria da Aneel tem cinco diretores, ou seja, uma votação só acontece com voto de, no mínimo, três diretores.

3 – A Aneel está criando um imposto para energia solar? 

Não e nem poderia, pois a agência não tem poder legal para criar tributos para o setor. A elaboração de política energética é atribuição do MME, que eventualmente pode abordar determinados temas no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), órgão de assessoramento da Presidência da República na formulação de políticas.

Além disso, a agência tem buscado a desoneração das tarifas de energia elétrica e, com isso, a retirada de subsídios criados para estimular modalidades de consumo e produção de energia, das quais entende que podem ter alcançado nível adequado de aprendizado, investimento ou desenvolvimento.

Segundo a agência reguladora, durante apresentação feita em reunião pública da abertura da Consulta Pública nº 25/2019, que prevê a alteração do sistema de compensação para a micro e minigeração de distribuída, uma mudança na metodologia evitaria custos da ordem de R$ 56 bilhões, até 2035, aos consumidores não enquadrados na modalidade.

4 – A retirada de subsídios é inédita no setor?

Não. No fim de 2018, por exemplo, buscando uma política de desoneração tarifária, o MME determinou a retirada gradativa, ao longo de cinco anos, dos subsídios destinados aos consumidores rurais, irrigantes, aquicultores e do segmento de água e saneamento. 

5 – Geração distribuída e micro/minigeração distribuída, são a mesma coisa?

Não. Importante destacar que até 2012, só existia a geração distribuída, que não teve adesão maciça, principalmente, por causa das regras de precificação da energia.

A modalidade de micro e minigeração distribuída foi instituída a partir da Resolução Normativa 482/2012, com o estabelecimento de condições gerais do acesso aos sistemas de distribuição e o sistema de compensação de energia (net metering). A norma possibilitou que a energia não consumida pelo usuário, mas injetada na rede, fosse transformada em crédito de energia ativa.

Também foram definidas as faixas para os sistemas e os enquadramentos das fontes. Algumas delas alteradas por resoluções nos anos seguintes.

Assim, apesar de terem denominação parecida, a geração distribuída e a micro e minigeração de energia são sistemas diferentes, não excludentes e não complementares.

6 – A micro e minigeração distribuída de energia são aplicadas apenas para a fonte solar fotovoltaica?

Não, mas a geração solar fotovoltaica corresponde por mais de 90% da potência instalada dos sistemas de micro e minigeração distribuída de energia elétrica no país. Também podem se estabelecer na modalidade: as centrais geradoras hidrelétricas (CGHs); eólicas; e termelétricas a biogás, biomassa e gás natural.

7 – O que prevê a proposta regulatória que altera o sistema de compensação para a micro e minigeração distribuída de energia? 

A proposta colocada na consulta pública nº 25/2019 prevê alterações no sistema de compensação, previstas na Resolução Normativa nº 482/2012, e delimita as opções que a Aneel entende como sendo as mais adequadas – com base nas análises e contribuições dos processos anteriores de audiência pública – e em consonância com o objetivo de alcançar a modicidade tarifária.

O texto inclui o pagamento do custo da rede (Tusd Fio B e Fio A) para a micro e minigeração local, desde que alcance o gatilho de 5,9 GW no Sistema Interligado Nacional (SIN) – ou seja, enquanto a potência instalada total de centrais de micro e miniGD não alcançar esta marca, os consumidores não pagam pelo uso do fio.

No caso da geração remota, a proposta prevê o pagamento de todas as componentes tarifárias, exceto a Tarifa de Energia (TE).

Para os consumidores que já possuem o sistema de micro e minigeração remota e local, a proposta da Aneel prevê que o gatilho para esse pagamento ocorra em 2030, como um período de transição. No entanto, o marco para início do pagamento ainda está em discussão, e cogita-se a sua prorrogação até 2045.

8 – A Aneel considera “atributos sociais” na consulta pública?

Não. Questões como geração de emprego e renda não são consideradas como premissas pela Aneel no âmbito da consulta pública. Isso porque, como entidade reguladora, a agência não pode considerar políticas públicas, tampouco os benefícios das fontes ao sistema.

No caso da fonte solar fotovoltaica, a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) calcula que, só em 2019, foram criados mais de 100 mil empregos em todo o país. A entidade também defende que há ganhos econômicos ao país, pois os consumidores aumentariam os gastos com bens de consumo e serviços com a economia na conta de luz.

9 – De que forma um projeto de lei pode interferir na atividade de regulação da Aneel?  

A princípio, não há interferência, uma vez que são processos diferentes, mas que podem seguir em paralelo. A Aneel, como reguladora, está dando andamento ao processo considerando a legislação vigente, e pela qual gerencia os encargos de uso do sistema, dentro das revisões tarifárias.

Na última terça-feira, 07/01, o presidente da República, Jair Bolsonaro, e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, concordaram em pautar um projeto de lei para o incentivo da modalidade de geração. Caso seja aprovado, o subsídio para a fonte solar passa a ser tratado como uma política pública, podendo contar com recursos federais para a sua viabilização, além de questões estruturais de execução, como a destinação dos valores e a fiscalização, por exemplo.

10 – A mudança nas regras vai inviabilizar novos empreendimentos de micro e minigeração distribuída?

Com menos incentivos, a tendência é de uma redução no volume de pedidos desses processos, no entanto, segundo o Ministério da Economia, o investimento deve continuar vantajoso.

Comparando os dados compilados pela MegaWhat em 06/11/2019 e de 09/01/2020, disponíveis na base de dados da Aneel, houve um crescimento expressivo na capacidade instalada de projetos de geração e micro e minigeração distribuída de energia, saltando de 1,7 GW na primeira data, para quase 2,1 GW na segunda, com um crescimento de 23,5% em dois meses.   

Esse crescimento já era esperado pelo mercado, uma vez que consumidores podem estar se antecipando à aprovação das novas regras, que se manteriam vigentes, com retiradas de subsídios em 25 anos (no ano de 2045) segundo relatos de diretores da Aneel.

No entanto, o processo para instalação de sistema é demorado, bem como os pedidos de parecer de acesso à rede. Assim, imagina-se que o crescimento da potência instalada da fonte tenha começado ainda em meados de 2019, com a abertura da audiência pública nº 1/2019, que detalhou os impactos regulatórios da mudança do sistema de compensação.

11 – Existe algum prazo para conclusão do debate sobre a revisão do net metering para a modalidade?

Não existe um prazo estabelecido para a decisão, pois os especialistas em regulação da Aneel ainda precisam consolidar as contribuições, analisar, aceitar e/ou rejeitar sugestões, antes de fechar a nota técnica final do tema – documento que apresenta a recomendação da área técnica para os diretores.

Quando isso acontece, o processo é finalizado e enviado para a diretoria, que pauta a votação do processo. Como dito anteriormente, as reuniões são realizadas às terças-feiras, e as pautas dos processos das próximas são divulgadas às quintas-feiras, mas não existe um prazo fixo para que isso aconteça.

Agora, a Aneel possui uma agenda regulatória, divulgada geralmente entre novembro e dezembro, que é um cronograma com previsões de datas. Na Agenda Regulatória 2020/2021, a perspectiva é que o tema seja analisado pela diretoria no primeiro semestre deste ano.

Confira também as análises da MegaWhat: 

GD no Divã

Revisão das regras aplicáveis à micro e minigeração distribuída

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