Danilo Barbosa escreve: Desafios tecnológicos para a abertura do mercado livre de energia

MegaWhat

Autor

MegaWhat

Publicado

18/Mar/2022 15:23 BRT

Por: Danilo Barbosa*


Cada vez mais próxima da realidade, a abertura do mercado livre de energia no Brasil avança na Câmara dos Deputados. De acordo com o PL 414/2021, o prazo atual para acesso ao mercado por todos os consumidores ficará em 42 meses. A abertura é a maior mudança à vista para as empresas do setor e para a maioria dos consumidores. Ainda assim, a transição energética é uma realidade maior. A geração distribuída, o armazenamento de energia e a eletrificação da mobilidade, para citar algumas das principais tendências, avançam de forma concomitante à abertura, e criam cenários mais complexos para a digitalização.

Nesta realidade, o mercado se depara com o desafio de suportar uma abertura progressiva e acelerada. É um momento de distribuição de responsabilidades e implantação dos sistemas e modelos que irão operar no mínimo pela próxima década. É necessário ser pragmático, mas ter um olhar no futuro, para evitar arranjos temporários ou desperdícios no caminho. Abaixo, alguns dos desafios tecnológicos, principalmente associados ao processamento de dados de medição, que virão com a mudança.

Telemedição versus profiling

Na nota técnica entregue pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em novembro de 2021, a organização indicava a possibilidade de suporte à migração para o mercado livre com medidores convencionais. Neste caso seria utilizado o Perfil de Carga, modulado pela medição mensal. Além desta aproximação para o perfil temporal, o processo de leitura manual dos medidores leva tempo, e é incompatível com a janela de contabilização do mercado livre, de forma que seria necessário trabalhar com estimativas também para o volume total de consumo no mês. A principal vantagem é que desvincula a portabilidade da modernização, que pode avançar por critérios diferentes.

Automação da consolidação e estimativas

Hoje, os volumes de energia medidos justificam a aplicação de processos manuais ou semiautomáticos para consolidação dos dados de medição. Isto envolve um trabalho dos agentes de medição, da CCEE e algumas vezes do consumidor, ou de uma gestora contratada. No caso de consumidores de menor porte, o nível de automação deve ser muito maior, e a consolidação manual passa a ser o tratamento de exceções. O processo não deixa de ser uma mediação entre agentes interessados, de forma que um dos desafios é manter a transparência, e a possibilidade de auditoria e contestação, tão automatizáveis quanto o processamento em si.

Agregação e novas modelagens complexas dos ativos de medição

Para conectar o processamento de informações no varejo ao mercado atacadista é necessária uma simplificação. As medições de um varejista correspondentes a um determinado submercado, por exemplo, podem ser todas agregadas, entrando como uma curva de carga única no balanço de energia. A agregação em si é simples, mas ela deve refletir diversos cenários mais complexos. No mínimo, ela observa a portabilidade dos consumidores. Mas além disso, mercados maduros suportam modelos complexos dos ativos de medição. Os modelos de compensação remota da GD são um caso de “meter splitting”, onde o volume registrado pelo medidor tem seu consumo dividido entre dois “varejistas”.

Transparência e governança de dados

A portabilidade da conta de energia pressupõe a portabilidade dos dados do consumidor. O desafio das empresas será ampliar as trocas de informação sem deixar de olhar para a segurança de dados sensíveis e confidenciais. A adequação à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (lei 13.709/18), dentro do contexto do mercado livre, ganha ainda mais relevância.

A tecnologia é um aspecto fundamental da abertura de mercado. Isso está implícito na atuação de qualquer varejista pela digitalização do relacionamento com os consumidores, mas é também fundamental no funcionamento do próprio mercado, como estrutura de suporte a um volume transacional sem precedentes no arranjo atual. Acompanhar de perto as movimentações da abertura e avançar na criação e adaptação de tecnologias que possam dar suporte às mudanças é essencial para as empresas do setor.

*Vice-presidente executivo da Way2 Tecnologia

Cada vez mais ligada na Comunidade, a MegaWhat abriu um espaço para que especialistas publiquem artigos de opinião relacionados ao setor de energia. Os textos passarão pela análise do time editorial da plataforma, que definirá sobre a possibilidade e data da publicação.

As opiniões publicadas não refletem necessariamente a opinião da MegaWhat.

Leia mais:

Marcos Leone e Paulo Mayon escrevem: Ampliação do mercado livre de energia e a segurança do mercado. Como avançar?

Lefosse Advogados escreve: “Princípio da Santidade dos Contratos” deve ser mantido em 2022

LGrid Markets escreve: Na contramão da modernização

Ana Carolina Calil e Karin Hatanaka escrevem: Decreto dá início à era das eólicas offshore no Brasil

Wagner Ferreira escreve: O que todo mundo deve saber para não faltar energia elétrica - parte 2