Marcos Leone e Paulo Mayon escrevem: Desvendando a “selva” da Inteligência Artificial sob a ótica do risco de crédito

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MegaWhat

Publicado

22/Abr/2022 14:58 BRT

Por: Marcos Leone e Paulo Mayon*

Há muito tempo, todos nós acompanhamos notícias e novidades no campo da Inteligência Artificial (IA) na mídia. Neste contexto, nos chama a atenção a quantidade de empresas (de microempresas à gigantes da tecnologia) que divulgam o uso extensivo de IA em seus produtos e processos. Todo este cenário nos induz a pensar que IA, se ainda não estiver sendo usado, o deverá ser a qualquer custo pela minha empresa. Afinal, além de se tratar de uma “bala de prata” capaz de resolver qualquer problema , a ação de divulgar ao mercado que usamos IA, nos trará uma imagem de modernidade e de digitalização muito bem recebida .

Mas será que tudo isto é verdade? Para desvendar esta “selva” de mitos e lendas urbanas que cercam a IA precisaremos, em um primeiro momento, entender, pelo menos conceitualmente, o que é IA.

Muitas vezes a IA é apresentada como uma única ferramenta a ser aplicada na resolução de problemas. Isto não é verdade. IA corresponde a um enorme grupo de ferramentas matemático-computacionais que têm como similaridade o fato de terem sido criadas através da inspiração em fenômenos ou comportamentos biológicos ou da natureza que têm algum grau de inteligência (também chamado de bio-inspiração). Uma boa analogia seria dizer que se os pássaros nos deram inspiração para criar os aviões, os neurônios nos inspiraram a criar as “Redes Neurais Artificiais - RNAs” (um subgrupo de ferramentas de IA), apenas como exemplo.

No entanto, apesar da analogia interessante, é importante entender que, diferentemente da criação do avião a partir da observação das aves, as ferramentas bio-inspiradas e classificadas como IA são criadas a partir de uma representação matemática do fenômeno biológico. Este é o primeiro ponto que começa a clarificar nossa visão sobre as ferramentas de IA, pois todas elas têm uma base comum na maneira como elas são matematicamente representadas. A Figura 1 mostra esquematicamente esta estrutura básica.

Figura 1 - Estrutura procedural básica em IA

Para entender mais ludicamente a Figura 1, podemos pensar em um processo no qual ocorre em um primeiro momento, a “percepção” de uma pessoa entrando em uma sala, sendo que esta “percepção” pode, por exemplo, ocorrer através da captura de imagens de um circuito de vigilância e, em um segundo momento, ocorre a “avaliação” desta “percepção” através de, por exemplo, um algoritmo que processa as imagens capturadas e, finalmente, o algoritmo fornece uma “resposta” dizendo que, por exemplo, uma pessoa entrou no escritório às 13:31.

Pode parecer um pouco complexo, mas este tipo de processo é usado por nós o tempo todo, como mostra a Figura 2. Nela fica evidente que, na prática, este processo nada mais é do que uma “avaliação” funcional, ou seja, na fase de “percepção” são trazidas informações (também chamadas de dados) para o nosso sistema, em seguida um funcional (no caso “x + y”) é aplicado a esta informação para, finalmente, gerar a resposta desejada (no caso “5”).

Figura 2 -Explicando a estrutura procedural em IA

Entretanto, a estrutura da Figura 2 funciona perfeitamente quando tivermos apenas “percepções” do tipo “x” e “y”, dado que “x” e “y” são números reais e o que se espera deste sistema é sempre obter a soma de “x” e “y” (e nada diferente disto). O processo da Figura 2 mostra o que chamamos de “solução fechada” e é justamente aqui que começa o primeiro ponto em que muitos iniciantes em IA começam a tomar decisões equivocadas, por exemplo, usando RNAs como funcional de “avaliação” para fazer cálculos tão simples quanto “x + y”. Desta forma, é importantíssimo que um engenheiro de IA tenha sempre o seguinte princípio em sua mente:

Desta forma, se pensarmos em, por exemplo, resolver um problema de avaliar a idoneidade de uma determinada contraparte em uma análise de crédito no qual são avaliadas as métricas (nossas “observações”) “x = pontualidade nos seus pagamentos” e “y = inexistência de certidões positivas de débitos” e dado que seja possível pontuar estas métricas em uma escala de zero a dez poderíamos propor uma solução do tipo:

Figura 3 -Avaliando idoneidade de contraparte usando “solução fechada”

Pelo diagrama da Figura 3 é possível perceber que sabíamos “a priori” que, para avaliar a idoneidade de contrapartes, era necessário fazer a média ponderada entre “pontualidade nos seus pagamentos” e “inexistência de certidões positivas de débitos” na qual a primeira métrica tem peso 2 e a segunda peso 3. Agora, o que aconteceria se:

  • Não fosse possível pontuar de maneira precisa as contrapartes quanto a estas duas métricas?
  • Se as pontuações destas duas métricas não fossem totalmente confiáveis?
  • Se não soubéssemos “a priori” como avaliar estas contrapartes, mas, por outro lado, tivéssemos acesso a uma base de dados com todas as “respostas” (no caso, as pontuações ou “scores”) que pudessem medir a idoneidade de um grande volume de contrapartes dados valores de “x” e “y”? Seria possível inferir uma boa ferramenta para fazer “avaliação” destas contrapartes?

Se a situação se encaixar em quaisquer casos acima, o uso de ferramentas de IA nesse singelo caso do processamento da “análise de crédito”, passará a fazer todo o sentido.

Em resumo, nesse esforço de síntese, fica aqui a mensagem de sempre verificar se para a resolução de determinado problema, não existe uma “solução fechada”. Se existir, o uso de ferramentas de IA seria extremamente desaconselhado. Somente na hipótese de não encontrar uma “solução fechada”, provavelmente o desenvolvimento e aplicação de ferramentas de IA passarão a representar a sua melhor escolha.

*Sócios e Fundadores da RISK3

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