Por: Reginaldo Medeiros e Matheus Lobo*
O setor industrial tem um futuro desafiador e complexo no caminho pela descarbonização das cadeias produtivas, e nas novas formas de energia uma chave para o sucesso desta mudança. Os aspectos tecnológicos, financeiros, institucionais, legais e regulatórios da chamada transição energética exigem uma definição clara de papéis entre as diversas instâncias da sociedade, como governo e iniciativa privada. No Brasil o tema tem sido muito debatido, mas faltam definições sobre armazenamento de energia elétrica e novos combustíveis, como o hidrogênio renovável, o queridinho dos especialistas. A promessa é descarbonizar o setor industrial e, enfim, realizar o sonho do Brasil em ser uma grande potência. Será?
O hidrogênio é uma molécula versátil, com aplicações que vão do aquecimento industrial e residencial à produção de aço e cimento; passando pelos fertilizantes e refino de petróleo. Poderá ser particularmente relevante no setor da mobilidade, a exemplo do seu uso em aeronaves, dada uma das características da molécula de hidrogênio ser sua elevada quantidade de energia química por peso. Comparando-se à gasolina, o hidrogênio concentra três vezes mais energia por unidade de massa. Suas aplicações e característica físico-química o colocam como um energético altamente promissor para a descarbonização do planeta.
A produção de hidrogênio pode ocorrer de diversas formas e a partir de diferentes fontes, sendo as poluentes as mais comuns hoje, como aquelas advindas do gás natural ou carvão. No entanto, fontes limpas como a biomassa e a quebra da molécula de água, processo conhecido como eletrólise, também são uma possibilidade. Este sistema necessita de uma grande quantidade de energia elétrica e, se renovável, pode-se dizer que o hidrogênio também é renovável (H2V). Nesse sentido, o Brasil é um país extremamente promissor para o desenvolvimento da tecnologia e produção de hidrogênio renovável, visto que 87% da sua matriz elétrica brasileira já é renovável. Além disso, a energia eólica e solar produzidas no país são tecnicamente mais produtivas do que a dos outros países, devido a condições naturais do vento e do sol.
O grande desafio do hidrogênio verde está associado aos custos de produção e logística de armazenamento. Segundo dados da Internacional Energy Agency (IEA), os métodos de produção mais poluentes custam entre US$1 e US$2,5 por kg de molécula, enquanto a produção por energias renováveis chega a custar entre US$4,0 e US$9,0 por kg. A diferença de custo é o problema real a superar: como alocar subsídios ao H2V brasileiro até que a produção se consolide e os custos caiam?
O hidrogênio renovável necessita de políticas públicas claras, que estimulam o desenvolvimento de um novo mercado até que o energético seja economicamente viável. No momento em que a conta de luz do brasileiro já leva pesados encargos aos consumidores, que por sua vez não tem acesso a mercados privilegiados, como o da Geração Distribuída, de onde virão os recursos para subsidiar o H2V brasileiro?
As diretrizes do governo para o desenvolvimento do H2V ainda são insipientes e insuficientes. É necessário que se defina rapidamente como e quem pagará o subsídio para desenvolver este mercado no Brasil, com um programa detalhado, a exemplo do Proálcool do século passado, para superar os enormes desafios tecnológicos envolvidos do H2V.
Os próximos anos serão decisivos para definir o papel que o Brasil ocupará na transição energética mundial. Mas, se quisermos ter protagonismo nesse movimento tão importante, são urgentes as definições que traçarão um futuro melhor ou pior para nós mesmos. Esperamos que o país não precise esperar 27 anos pelas decisões políticas, como o consumidor de energia elétrica esperou pela portabilidade da conta de luz.
* Reginaldo Medeiros é presidente da RAD Energia e Matheus Lobo e analista regulatório da RAD Energia.
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