Opinião da Comunidade

Xisto Vieira Filho escreve: As prioridades do setor elétrico brasileiro

Por: Xisto Vieira Filho* Sempre que ocorre uma mudança de governo e, consequentemente, trocas no comando dos ministérios, ficamos todos aguardando a definição de prioridades que será dada pela administração de cada pasta. No nosso caso, as atenções estão voltadas para o setor elétrico. Nas últimas décadas, foram aprovadas diversas leis e apresentados outros tantos projetos de nova legislação que pretendem dar conta dos principais desafios para evolução deste importante segmento. Graças ao esforço de especialistas, técnicos e parlamentares de alto nível, já avançamos muito.

Xisto Vieira Filho escreve: As prioridades do setor elétrico brasileiro

Por: Xisto Vieira Filho*

Sempre que ocorre uma mudança de governo e, consequentemente, trocas no comando dos ministérios, ficamos todos aguardando a definição de prioridades que será dada pela administração de cada pasta. No nosso caso, as atenções estão voltadas para o setor elétrico.

Nas últimas décadas, foram aprovadas diversas leis e apresentados outros tantos projetos de nova legislação que pretendem dar conta dos principais desafios para evolução deste importante segmento. Graças ao esforço de especialistas, técnicos e parlamentares de alto nível, já avançamos muito.

Mas ainda há um caminho a percorrer. E, nesse trabalho, ainda não conseguimos consolidar em um único documento quais são as nossas prioridades, a cada tempo, que devemos postular no setor. A título de contribuição, vamos apresentar uma lista com sugestão de ações prioritárias.

Envolvem o desenvolvimento de tecnologias, o aprimoramento de processos e programas e a atualização de marcos regulatórios. É uma agenda técnica, pesada, mas que precisa ser enfrentada. Nosso objetivo é apresentar uma visão de aprimoramento desse setor, que é a base para qualquer economia, e fundamental na promoção da qualidade de vida.

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De uma forma geral, formuladores de políticas energéticas em diversos países no mundo, e no Brasil, em certa dose, têm concentrado suas prioridades em aspectos climáticos, com foco em minimizar ou eliminar as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Ou seja, como o setor elétrico pode atuar para evitar o aumento do aquecimento global. Essa função é de extrema importância deve ser, sempre, um dos pilares de qualquer lista de prioridades.

No entanto, é também muito relevante que seja observado o prazo estabelecido para a descarbonização, que é o ano de 2050. Sobre esse meta, aliás, desde já sabemos que, a nível mundial, não será atendida, já que a maioria dos países ainda têm um percentual acima de 50% da sua matriz elétrica formada por fontes fósseis.

Esse não é, nem de longe, o caso do Brasil. Nossa matriz é formada por 87% de fontes renováveis, graças à predominância de hidrelétricas, responsáveis por cerca de 60% da capacidade instalada. Por isso, nosso sistema elétrico emite muito pouco GEE, cerca de 2% do total no Brasil. Essa emissão só é maior em períodos hidrológicos desfavoráveis, como o que ocorreu em 2021, por exemplo. Este cenário dá ao Brasil mais tempo para realizar os aprimoramentos necessários. E nós temos todas as condições de preparar um futuro adequado para o nosso sistema.

As prioridades que elencamos aqui seguem o firme propósito de o país atingir a sua Matriz Elétrica Ótima (MEO). E o que seria a MEO? É a que reúne três vetores: minimização de emissões de GEE, com a máxima segurança do sistema, e ao menor custo. A montagem dessa matriz, aliada a princípios básicos da operação, nos indica os caminhos para um futuro sustentável do setor elétrico.

Qualquer definição de prioridades precisa partir da premissa de que o sistema elétrico tem que atender a dois “reis”. O Rei 1, o maior deles, é o consumidor. Nossa majestade quer ser atendida com segurança e preços baixos, e dá bastante atenção também a requisitos climáticos. Entende, no entanto, que cabe ao governo definir os termos e políticas para atendimento à agenda de baixo carbono levando em conta o que cada setor causa, em termos de emissão de GEE.

A rigor, o Rei 2 é um auxiliar imediato do Rei 1. É quem promoverá todos os esforços para atender os requisitos dos consumidores. Trata-se do Operador Nacional do Sistema (ONS), entidade com histórico de competência e sucesso. Ao fim, todas as demais atividades setoriais deveriam ser preparadas para fortalecer o rei 1 e rei 2.

Então, o que os nossos reis precisam para desenvolver um setor com preços baixos, segurança robusta e minimização de GEEs? No caso do Brasil, apesar de termos tempo, precisamos dar início às mudanças o quanto antes. É um trabalho de longo prazo. A seguir, enumeramos as medidas, sem ordem de prioridade, que consideramos “tiros certeiros” e necessários para a contínua evolução do nosso setor e adequação às transformações em curso.

1. Abertura do mercado de energia elétrica: medida pode resultar em menor preço do megawhat (MW) para os consumidores.

2. Adequar os leilões de energia à nova realidade de consumidores que se estabelecerá a partir do item 1. Além disso, manter os leilões de capacidade, deixando claro o conceito de serem leilões de confiabilidade.

3. Otimização dos programas computacionais que respaldam a comercialização de energia e as análises de segurança energética e elétrica. Essas ferramentas foram desenvolvidas pelo Centro de Pesquisas de Eletricidade (Cepel), órgão cujo papel tem sido bastante reduzido – de forma inexplicável, aliás, diante da importância das suas atividades. Os programas, que procuram seguir fisicamente a representação do sistema, precisam de um novo “guardião” para realizar as alterações necessárias. Manter essa sistemática ou utilizar outra, mais atrelada ao mercado, é algo a ser estudado.

4. Melhorar as ferramentas de eficiência energética: sua importância dispensa comentários.

5. Introduzir os chamados “Serviços Ancilares”. É um mercado que vamos usar muito no futuro próximo, sendo incorporado tanto nos contratos de longo prazo, quando em atividades de curto prazo (necessidades adicionais do ONS). Envolve elementos de segurança (inércia, controladores, entre outros) e serviços diversos, como acompanhamento da carga e reserva.

6. Promover aumentos sucessivos do nível de penetração de renováveis (eólica e solar), associados a níveis de geração termelétrica que assegurem a confiabilidade dessa expansão. As usinas eólicas e solares são fundamentais para a nossa expansão, pelas excepcionais características climáticas e de preço. Combinadas com geração termelétrica dão total robustez técnica e econômica ao sistema.

7. Incentivar a Geração Distribuída (GD) de forma segura e econômica, e dotar o ONS de ferramentas computacionais de alto nível para prever adequadamente o comportamento dessas novas estruturas, que por vezes se comportam como carga, outras vezes como geração, para efeito do ONS. Estamos falando em sistemas de inteligência artificial e redes neurais, por exemplo.

8. Incentivar e promover a implantação de projetos de geração termelétrica com hidrogênio verde. Objetivo é manter o sincronismo, a segurança e a controlabilidade do sistema. Aliás, aspectos de controlabilidade serão de extrema importância para o ONS, devido ao aumento das intermitências introduzidas pela geração distribuída e pelas fontes eólica e solar.

9. Da mesma forma, e com os mesmos objetivos, incentivar e implantar projetos de CCUS (captura e uso de carbono) para minimizar emissões de CO2.

10. Investir no desenvolvimento de projetos de baterias, tanto para uso direto do consumidor como de uso sistêmico, de porte maior. Esses equipamentos certamente serão atores do primeiro time da MEO.

11. Preparar os marcos regulatórios que respaldem essas novas tecnologias.

12. Adaptar o planejamento da expansão a tais requisitos dos consumidores e do ONS, principalmente no que se refere a preços (melhoria da análise de requisitos de transmissão, compensações síncronas especiais, reatores, troncos de corrente contínua, vis a vis os requisitos de outras alternativas destacadas neste artigo).

13. Iniciar as análises para desenvolvimento do futuro ONS, talvez com uma matriz centralizada e “filiais” locais, tendo em vista a tendência, já em curso, de descentralização do sistema. O mesmo deve ser feito em relação ao planejamento e à regulação.

De forma breve, esta é nossa contribuição do que seriam as medidas prioritárias para o sistema elétrico brasileiro. Para não nos alongar, deixamos de abordar outros temas relevantes como o uso do gás natural das reservas do pré-sal, os problemas relacionados ao GSF (sigla em inglês que significa Generation Scaling Factor) e que impactam às hidrelétricas, a questão de garantias físicas, entre outros. Fica para a próxima oportunidade.

* Xisto Vieira Filho é presidente da Associação Brasileira Geradoras Termelétricas (Abraget)


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