Depois de completar em cinco anos o marco de 1,2 GW em projetos de geração renovável em operação, a Echoenergia, recém adquirida pelo grupo Equatorial, tem grandes ambições pela frente. Além dos planos de dobrar de tamanho até 2025, desenvolvendo um portfólio de projetos composto em sua maioria pela fonte solar fotovoltaica, a empresa, agora com um custo de capital mais baixo proporcionado pelo novo controlador, já se posiciona para um mercado livre cada vez mais competitivo e de varejo, conforme reduzem os requisitos de migração dos consumidores hoje atendidos pelas distribuidoras.
Pioneira na viabilização de projetos de geração eólica para o mercado livre, por meio de contratos de longo prazo firmados com consumidores “triple A” (com risco de crédito muito baixo), a Echoenergia negocia agora novos contratos para desenvolver os próximos projetos. Nesse cenário, o mercado de distribuição da Equatorial passa a ser uma alternativa nos próximos anos, em um modelo de comercialização varejista, já que os grandes consumidores são cada vez mais escassos.
Segundo Augusto Miranda, presidente da Equatorial, um grande diferencial da companhia, que opera seis concessões de distribuição – cinco delas no Norte e Nordeste e uma no Rio Grande do Sul -, é conhecer os clientes. “Eu sei quem paga a conta e quem não paga. As vezes, o cliente é livre e não nos interessa, porque quando era cativo não pagava”, explicou, em conversa com jornalistas durante visita ao parque eólico Serra do Mel II, no Rio Grande do Norte, de 206 MW de potência, cuja inauguração marcou os 1,2 GW da nova controlada.
A companhia tem 10 milhões de consumidores dentro de suas áreas de concessão, sendo cerca de 800 MW médios referentes a consumidores do tipo A4, com potencial de migração ao mercado livre por serem atendidos por tensão superior a 2,3 kV. De acordo com Miranda, o movimento poderá acontecer depois que os limites de migração forem reduzidos a 500 kW, em 2024.
Os projetos de geração na carteira da Echoenergia devem ser viabilizados antes da liberação do mercado livre. Segundo Edgard Corrochano, presidente da Echonergia, a empresa pretende negociar a energia como incentivada, com acesso a um desconto no uso da rede que torna seus preços mais competitivos no mercado. Para isso, é preciso já ter outorga e que as obras sejam concluídas até 2025.
“Em muitos dos projetos já temos parecer de acesso assinado”, disse Corrochano. O entendimento do executivo é que aqueles projetos com Contrato de Uso do Sistema de Transmissão (Cust) assinado não precisarão participar de um leilão de margem de escoamento atualmente em estudo pelo governo, que busca uma forma de decidir quais dos 200 GW em outorgas de renováveis terão acesso à transmissão, recurso escasso no momento. Ele não quis informar quais projetos têm Cust, mas disse que o complexo solar Barreiras I, na Bahia, com 350 MW, já tem o escoamento garantido. Falta agora fechar os contratos de venda de energia de longo prazo (PPAs, na sigla em inglês). “Estamos em discussões, mas não podemos abrir muito. Trabalhamos para viabilizar, estamos prontos”, disse.
Antes disso, o foco da Equatorial ainda é na integração com a Echoenergia, já que o negócio, anunciado em outubro do ano passado por cerca de R$ 7 bilhões, foi concretizado no início de março.
“Colocamos de pé todos nossos projetos com um custo de capital mais alto que o da Equatorial, que é uma companhia mais sólida e robusta, com uma capacidade de crédito e alavancagem enorme”, disse Corrochano, para quem o negócio de renováveis é “um jogo de escala” e superar o marco de 1 GW colocou a companhia em destaque no mercado.
A dificuldade em dar um prazo para o início de novas obras vai além da questão do escoamento. “De um lado, temos a guerra entre Rússia e Ucrânia, e a instabilidade da moeda. De outro, temos instabilidades na China pela política de zero Covid-19. Isso cria problema na oferta de produtos, como painéis solares, mas esperamos uma estabilização no curto a médio prazo para fazer”, disse Corrochano.
Como a maior parte dos equipamentos da energia solar fotovoltaica vem da China e são dolarizados, há impactos nos preços no curto prazo. “Mas vemos uma curva onde a normalidade está próxima de retornar”, disse o presidente da Echoenergia.
“Vamos deixar o projeto no ponto de bala para iniciar assim que as outras condições vierem”, completou Augusto Miranda. Em paralelo, as empresas seguem com as etapas de projeto executivo, avançando na engenharia, para que a execução seja célere e o risco de execução seja reduzido ao mínimo possível.
A hibridização de projetos também entrou na equação do grupo para a viabilização dos novos empreendimentos. Segundo Corrochano, o parque Serra do Mel II deve receber mais 150 MW em paineis solares fotovoltaicos, em um sistema de geração associada. Embora o vento do ativo seja diurno, com menos complementariedade com a fonte solar, os cálculos da companhia apontam que esse é o limite de potência que pode ser acrescentada sem que o Must (montante de uso do sistema de transmissão) contratado seja superado, o que resultaria em uma penalidade para a geradora. Ou seja, o projeto hoje tem um excedente da rede de transmissão contratada, e a empresa vai otimizá-lo por meio da adição dos painéis solares. Não serão necessários novos investimentos na subestação do empreendimento, já que o transformador tem 80 MVA de capacidade sobrando.
Como a energia eólica do projeto já está contratada, a companhia não poderá associar à solar para ter uma curva “flat” de geração (sem modulação ao longo do dia). “Mas, com a comercializadora eu posso deixar flat, faço swap, vendo. Eu resolvo”, explicou. “Falta comprar o equipamento e a gente querer fazer. Vamos fazer no momento adequado”, completou.
A adição da Echoenergia ao grupo Equatorial é importante por completar a companhia, que agora atua em geração renovável, transmissão e distribuição de energia, além de serviços associados e um braço de saneamento. Por outro lado, a geradora também terá lições a aprender com o novo controlador.
“As pessoas tem preconceito com as empresas do Norte, e chegamos lá e descobrimos coisas maravilhosas”, disse Miranda. Segundo ele, embora as distribuidoras estatais compradas pelo grupo nos últimos anos fossem subinvestidas, os funcionários desenvolveram processos maduros para conduzir as atividades. “Aí chegamos lá e temos que copiar as práticas, abrir o canal para absorver. Com a Echoenergia é mais ainda, porque é uma empresa de ponta”, afirmou.
*A repórter viajou a Serra do Mel (RN) a convite da Echoenergia