Congresso

Com prazo apertado, MP 1.118 gera embate entre consumidores e geradores

Com prazo apertado, MP 1.118 gera embate entre consumidores e geradores

A Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias (Abeeólica) rebateu cálculos apresentados por entidades representantes de distribuidores e consumidores de energia a respeito dos impactos na tarifa causados pelas emendas aprovadas pela Câmara dos Deputados na Medida Provisória (MP) 1.118, e fez um alerta para os investimentos bilionários que poderão ser perdidos se o texto não for convertido em lei.

Enquanto consumidores e distribuidores afirmam que as emendas vão gerar custos adicionais de R$ 8 bilhões na conta de luz por ano, a Abeeólica afirma que o efeito nos encargos será neutro. O problema, segundo a entidade, é se a MP caducar sem essas medidas: “Serão R$ 60 bilhões em investimentos que, sem a MP, vão sumir do mapa”, disse Fernando Elias, presidente do conselho da associação.

“A MP vai viabilizar 11 GW a preços mais competitivos, que irão contribuir para a modicidade tarifária. Isso representa R$ 60 bilhões em investimentos para o Nordeste, numa das regiões mais carentes do Brasil”, disse à MegaWhat Elias, que também é diretor de Regulação e Comercialização da Casa dos Ventos.

O tom das discussões sobre a MP subiu nos últimos dias, devido à proximidade com o fim do prazo para sua aprovação. O texto está na pauta do Senado Federal da próxima segunda-feira, 26 de setembro, e perde a eficácia se não for aprovado até o dia 27 deste mês.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE Minuto Mega Minuto Mega

Originalmente, a MP 1.118 tratava da tributação de combustíveis, mas recebeu emendas na Câmara que incluem a prorrogação em dois anos para o prazo que projetos de geração renovável entrem em operação mantendo os descontos pelos usos das redes de distribuição (Tusd) e transmissão (Tust), além de alterar as regras do sinal locacional da transmissão, prevendo estabilidade na Tust ao longo de toda a outorga.

Após a aprovação das emendas pela Câmara, entidades como a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), a Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), e a Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) enviaram cartas aos senadores e ao governo pedindo a exclusão das emendas, pelo impacto de R$ 8 bilhões que seria causado nas tarifas. Não houve detalhamento sobre as premissas que chegaram nesses valores.

O impacto, segundo a Abrace, está relacionado ao volume maior de projetos de geração que poderão ser viabilizados com desconto nas tarifas de transporte, que são custeados pelo encargo setorial Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), pago por todos os consumidores e cujo orçamento chegou a R$ 32 bilhões em 2022.

Segundo Fernando Elias, da Abeeólica, contudo, a viabilização de 11 GW a mais em projetos de renováveis traria no máximo um custo de R$ 1,5 bilhão por ano à CDE, considerando um encargo de cerca de R$ 50/MWh. 

O efeito seria neutro, na visão do executivo, devido à mudança na metodologia do sinal locacional da tarifa de transmissão prevista por outra emenda na MP. Ele citou números elaborados pela consultoria PSR no contexto da Consulta Pública 39 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que tratou da intensificação do sinal locacional nas tarifas de transmissão e resultou na aprovação de uma nova regra na última terça-feira, 20 de setembro.

Segundo a PSR, como a mudança do sinal locacional encarece as tarifas de transmissão pagas pelos geradores do Nordeste, vai aumentar o peso na CDE dos subsídios dados pelo desconto pelo uso da rede – que será ampliado, pela mesma MP. A PSR calcula que, se as regras atuais do sinal locacional forem mantidas para os geradores existentes, o impacto na CDE seria R$ 1,5 bilhão menor.

“O consumidor deixa de gastar R$ 1,5 bilhão, e isso compensa a eventual expansão dos 11 GW em renováveis. Assim, a MP é neutra em encargo”, disse Elias.

Sinal locacional

O presidente do conselho da Abeeólica aproveitou para questionar a regra aprovada pela Aneel nesta semana sobre a intensificação do sinal locacional. A agência afirmou que, com a alocação adequada dos custos de transmissão naqueles geradores que mais oneram a rede, os consumidores do Norte e Nordeste terão reduções médias de 2,4% e 0,8% nas tarifas, respectivamente.

“Mas ele vai pagar mais caro pela geração, e a geração tem um peso maior na tarifa”, disse Elias. Ele destacou ainda que haverá aumentos de 20% e 35% nas tarifas de transmissão dos consumidores do Sudeste e Sul, respectivamente. “Será que, com isso, a indústria não vai sofrer?”, questionou.

Para Elias, não foi feita uma análise “global” do impacto da mudança, que ele considerou inadequada por “olhar o retrovisor”, baseada “numa lei criada há 20 anos, com o objetivo de viabilizar termelétricas no Sudeste depois do racionamento de 2001”.

“Não parece ser o melhor para o país esse movimento da Aneel, que tem caráter de planejamento, de posicionamento do Brasil frente ao crescimento das fontes renováveis no mundo inteiro”, disse Elias. A MP, segundo ele, “visa corrigir as distorções de um sistema que estava crescendo de forma eficiente.”

A regra de intensificação do sinal locacional “desotimiza a expansão do sistema ao mandar investir em eólicas no Sul e não no Nordeste”, criticou Elias. “É como sempre treinar um cara para jogar basquete, mas agora chegar e falar: você vai jogar boliche”, afirmou.

Visão dos consumidores

Questionado pela MegaWhat sobre as críticas da Abeeólica, Paulo Pedrosa, presidente da Abrace, disse que a entidade mantém seus cálculos que indicam o impacto de R$ 8 bilhões nas tarifas, “os mesmos da Abradee e alinhados aos da Aneel, com apoio de uma gigantesca coligação de consumidores”.

Pedrosa disse ainda que as emendas da MP 1.118 não agradam geradores de outras regiões do país, como investidores de eólicas do Rio Grande do Sul.

Visão do regulador

A MegaWhat também procurou a Aneel em relação aos comentários feitos sobre as novas regras do sinal locacional. Em nota, a agência reguladora defendeu sua nova metodologia, “em estrito cumprimento ao comando legal de assegurar menores encargos para os agentes que menos onerem o sistema de transmissão.”

Na nota, a Aneel reiterou as expectativas de redução do custo da energia no Norte e Nordeste, e o fato de que a consulta pública teve três fases, que permitiram que “toda a sociedade participasse e apresentasse contribuições”, que resultaram em mudanças graduais divididas em cinco ciclos tarifários a partir de 2023.

“A Aneel avaliou cada uma das contribuições apresentadas na Consulta Pública e, portanto, tem total segurança na metodologia aprovada, que busca trazer sinais de preços corretos, otimizando a expansão e a operação do setor elétrico brasileiro. A Aneel segue a inteira disposição para esclarecer a decisão tomada e avaliar eventuais questionamentos”, disse a agência, em nota.

Matéria bloqueada. Assine para ler!
Escolha uma opção de assinatura.