Contrariando o bordão que utilizava na televisão, o deputado Celso Russomano (Republicanos-SP) dividiu o setor de energia com o Projeto de Lei (PL) 2.703/2022, de sua autoria. O texto, aprovado nesta terça-feira, 6 de dezembro, no plenário da Câmara dos Deputados, prorroga por seis meses o prazo para que projetos de geração distribuída peçam conexão à rede dentro das regras vigentes e amplia os tipos de projetos que podem ser enquadrados na categoria, incluindo PCHs de até 30 MW e uma nova demanda para hidrelétricas de até 50 MW na região Centro-Oeste.
Desde 23 de novembro, quando teve o seu regime de urgência aprovado pelos deputados, o projeto gerou mobilização de diversas entidades setoriais, com levantamento de custos e benefícios da postergação do prazo e da ampliação do escopo original. E mesmo não estando bom para todas as partes, o texto aprovado segue para votação do Senado Federal.
Segundo a Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica (Abradee) a aprovação do texto deve onerar o consumidor em R$ 118 bilhões até 2045, sendo R$ 39 bilhões decorrentes da postergação do benefício para GD; R$ 56 bilhões da caracterização de PCHs na categoria; e R$ 23 bilhões pela substituição de termelétricas por hídricas no Centro-Oeste.
“O consumidor comum pagará por esta conta, mas sequer foi consultado. O lobby dos instaladores de painéis solares fala em “Taxar o sol”, mas não explica que ricos se beneficiam e os pobres pagam a conta. Tudo isso enquanto a geração distribuída atinge patamar recorde na matriz elétrica com 15 GW, superando as próprias projeções de crescimento do segmento”, disse a associação.
Além disso, a associação disse ver o texto como uma “pedalada” no recém-criado Marco Legal da Geração Distribuída.
A Frente Nacional dos Consumidores de Energia (FNASE) também aponta que não houve consulta da sociedade nesta aprovação. Antes da deliberação, e que alterou o prazo de projeto inicial de 12 meses para seis meses, a frente destacava que o custo a ser embutido aos consumidores era de R$ 80 bilhões.
Solar e GD
Estudo recente da consultoria especializada Volt Robotics, encomendado pela Associação Brasileira de Energisa Solar Fotovoltaica (Absolar), aponta que o crescimento da geração própria de energia solar deverá trazer mais de R$ 86,2 bilhões em benefícios sistêmicos no setor elétrico para a sociedade brasileira na próxima década. Dessa forma, reduziria a conta de luz de todos os consumidores, inclusive os que não tiverem sistema solar próprio, em 5,6% até 2031.
E não somente pelo custo, a associação entende que a postergação do prazo é justificada pelo descumprimento do prazo máximo de até 180 dias – previstos pelo marco legal, contados da data de publicação – de uma regulamentação pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e implementação pelas concessionárias e permissionárias de distribuição de energia elétrica.
“Como, até o momento, a lei não foi cumprida e a Aneel e as distribuidoras não têm sido capazes de cumprir os prazos e procedimentos previstos, impactando diretamente nos consumidores, a sociedade e o setor fotovoltaico esperam a aprovação plena da matéria no Congresso Nacional”, comenta Rodrigo Sauaia, presidente-executivo da Absolar.
Em evento promovido pela Absolar na manhã desta quarta-feira, 7 de dezembro, Barbara Rubim, vice-presidente do conselho da associação, ainda destacou que espera a aprovação pelo Senado na próxima semana, para demonstrar o compromisso do país com o setor de energia e a segurança jurídica dos acordos firmados.
“Quiçá semana que vem a gente comemore a restituição de mais seis meses de prazo para o consumidor poder gerar sua energia, riqueza e poder ao nosso país”, disse Rubim.
De acordo com Guilherme Chrispim, presidente da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), “a decisão é correta. É preciso deixar de olhar a geração distribuída como um problema, pois ela não é, e sim como uma solução para a segurança energética do Brasil. Precisamos de uma discussão mais ampla e menos protecionista”.
PCHs na GD
Os trechos referentes às PCHs foram objeto de pedidos de destaque de partidos da oposição, mas mantidos nas respectivas votações e aprovados. Para a Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel) a implantação dessas usinas pode proporcionar uma economia de até R$ 13 bilhões para os consumidores, além de serem fontes de energia limpa e renovável, com cadeia produtiva 100% nacional gerando empregos aqui no país.
Na visão da Abragel a aprovação também é considerada muito positiva, pois apresenta aspectos relevantes para o setor elétrico brasileiro, para o segmento das pequenas centrais hidrelétricas e para os consumidores de energia elétrica.
E o mercado livre?
Em evento com analistas e investidores nesta quarta-feira, 7 de dezembro, o diretor de Regulação e Mercado da Engie Brasil Energia (EBE), Marcos Keller, disse que a companhia não defende a aplicação de subsídios para a fonte solar.
No entanto, uma vez que há subsídios para a geração distribuída, entende que deveria ser aplicada a isenção de tarifa fio para os consumidores de baixa tensão que migrarem para o mercado livre no futuro.
“Por que uma solar de 5 MW pode vender para baixa tensão com subsídio e uma solar de 50 MW não pode?”, questionou o executivo, durante encontro anual da companhia com investidores.
Na mesma linha, o diretor de Comercialização de Energia da companhia, Gabriel Mann, destacou que seria importante adotar a mesma política para a geração distribuída e para o mercado livre na baixa tensão. “Isso seria uma forma de competir com a GD, que, de certa forma, já tem um benefício”, completou.
Para o presidente e diretor de Relações com Investidores da EBE, Eduardo Sattamini, esse desequilíbrio em torno dos subsídios pode prejudicar a organização do setor. “Isso vai estimular o gerador, ao invés de fazer uma planta solar de 50 MW, construir dez usinas de 5 MW”, afirmou o executivo.