Por: Juliano Pereira*
As pautas relacionadas à transição energética no Brasil estão cada vez ganhando mais espaço entre os consumidores, porém, há ainda diversos desafios para colocar esse novo cenário efetivamente em prática nas variadas propriedades brasileiras.
A expansão do setor elétrico no Brasil por meio da energia fotovoltaica tem esbarrado em alguns importantes entraves. Um deles é a implementação de restrições para novas conexões à rede ou recomendação de limitação de injeção de energia em horários específicos.
Isso tem ocorrido pois a conexão desses novos sistemas ocasionaria, em tese, a inversão de fluxo na rede e consequentemente acarretaria em sobrecarga, interrupções no fornecimento de energia e desequilíbrio de tensão.
O fluxo de potência é a trajetória percorrida pela carga nos componentes do sistema elétrico, definindo o comportamento das correntes, tensões e potências nas extensões dos circuitos do sistema elétrico. No modelo clássico do Sistema Interligado Nacional (SIN), o sentido normal do fluxo vai dos grandes centros geradores em direção aos consumidores.
Em algumas situações são identificados determinados pontos em que o fluxo se dirige no sentido contrário ao convencional, acarretando instabilidade no comportamento das variáveis elétricas. Contudo, a inversão de fluxo em si não chega a ser um problema para a infraestrutura da rede. A complicação se estabelece quando o fluxo de potência reverso provoca violação dos limites de carregamento dos equipamentos da rede elétrica. Portanto, para determinar se de fato a inclusão de uma nova unidade geradora irá impactar na qualidade e estabilidade da rede e avaliar quais seriam as opções viáveis para eliminar essa inversão, é necessário um estudo do fluxo de potência. A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) estabeleceu a Resolução Normativa Aneel nº 1.000/2021, que determina que as operadoras de energia devem realizar estudos para identificar soluções viáveis para eliminar a inversão de fluxo. Essas soluções incluem a reconfiguração de circuitos, a definição de novos circuitos elétricos, conexões em níveis de tensão superiores e até mesmo a redução da potência injetada.
No entanto, temos visto na prática que novos projetos em diversas regiões do País estão deixando de ser instalados ou estão limitados a operar com capacidade reduzida, mesmo que, em muitos casos, não haja evidência de que essas novas conexões causariam um impacto negativo na rede local. De acordo com dados da Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica), as suspensões e cancelamentos de projetos fotovoltaicos por parte das concessionárias de energia elétrica já resultou em um prejuízo estimado em mais de R$ 3 bilhões para o setor. O levantamento da associação aponta para cerca de 1 GW em projetos represados pelas concessionárias, somando mais de 3 mil pedidos de conexão cancelados e suspensos nos últimos meses.
A solução com armazenamento
Uma solução potencial que poderia tanto remediar o problema da inversão de fluxo, como também acelerar uma revolução energética, é o uso de baterias para armazenar o excedente de energia gerado. Com isso, o armazenamento também ofereceria a perspectiva de uma maior autonomia na geração e consumo de energia, estabelecendo um novo cenário para a autossuficiência energética.
O sistema fotovoltaico com armazenamento em bateria permitiria a liberdade de gerar a própria energia, armazená-la para uso quando necessário e uma maior previsibilidade de gastos diante das flutuações de tarifas de energia. A independência energética, certamente, reduziria a demanda sobre a rede e contribuiria para um sistema de energia mais sustentável e equilibrado.
Por isso, a adoção de baterias traz benefícios significativos, sendo uma solução para casos em que a produção supera a demanda. Ou seja, o sistema de armazenamento de energia torna-se essencial para estabilizar a produção das fontes não despacháveis, ou seja, ele permite capturar o excesso de energia gerada durante períodos de baixa demanda e liberá-la quando a demanda é alta.
Devido a esses fatores, o mercado de armazenamento de energia está se tornando realidade. O crescimento no uso de baterias é uma tendência mundial, especialmente com a redução dos custos dessas tecnologias e ao aumento da eficiência energética. Nos últimos 10 anos, o custo das baterias reduziu mais de 85%, de acordo com o estudo Mercado de Armazenamento de Energia, desenvolvido pela Greener.
Nesse momento crucial do setor elétrico brasileiro, é preciso fomentar o uso de baterias para massificar a microgeração e minigeração de energia, de forma a integrar essas novas tecnologias para modernizar a rede e torná-la mais resiliente.
Nas mãos, o futuro do Brasil
As políticas de descarbonização e a necessidade de maior estabilização das fontes renováveis, como a eólica e a solar, já ditam o ritmo de expansão do sistema elétrico brasileiro. Há uma mudança de paradigma em curso no setor de energia e a geração distribuída, bem como o armazenamento de energia, são componentes fundamentais dessa transformação.
Soma-se a isso a tendência apontada pelo no Plano Decenal de Energia, promovido pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia (MME), de redução da participação das usinas hidrelétricas dos atuais 57% para 45% até 2031, elevando a capacidade do fornecimento de energia eólica e solar no país. Isso se deve a não haver nenhuma usina hidrelétrica de grande porte em construção já que existem barreiras impostas pelo licenciamento ambiental — que não permite a construção de usinas com reservatório —, o alto custo dos empreendimentos e a ampla penetração de fontes renováveis intermitentes.
Portanto, a inversão de fluxo, mais do que um problema, é uma oportunidade para repensar a rede de energia e prepará-la para um futuro mais verde e sustentável para todos os brasileiros.
* Juliano Pereira é Country Manager da SolarEdge Brasil
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